Rio, 24 de novembro de 1962.
Prezado amigo Jolindo:
São tantas as mensagens que recebo do Estado, após o desconcertante resultado das urnas, que tive de demorar mais tempo do que desejara a resposta à sua delicada e atenciosa carta. Sei bem avaliar os nobres sentimentos que a ditaram. E desejo transmitir-lhe e a todos os seus os meus sinceros e profundos agradecimentos. Penso, contudo, que não se deve culpar tanto a ignorância ou falta de discernimento da maioria do eleitorado capixaba. Outros responsáveis existem, mais proeminentes e censuráveis, para a triste realidade estadual. Recuso-me, simplesmente, a acreditar que tenha sido derrotado pelo voto dos menos esclarecidos e mais desamparados. É difícil fazer-se a radiografia de um pleito. Há uma parcela de culpa em cada um de nós. Houve erros acumulados em todas as áreas. Procurei, em rápidas pinceladas, analisá-los, na mensagem que me encomendaram. Não era fácil redigi-la. Se a fizesse lacônica demais, me censurariam. Se nela dissesse tudo o que sinto, diriam que era “choro”. O fato é que, por circunstâncias várias, já fui chamado tarde, como remédio de última hora para salvar um doente em agonia. Não havia unidade de vistas no partido; a coligação já estava praticamente formada; o adversário tinha, em sua corrida para o posto, um avanço de 3 anos e meio; a magistratura, por fas ou por nefas, se acumpliciara contra nós; não conseguimos despertar as consciências dos indecisos e indiferentes; não tínhamos recursos e não poderíamos supor que a corrupção governamental chegasse ao ponto que chegou. Existem outros fatores que me forro de enumerar. O fato é que, ainda assim, arrancamos milhares de votos e chegamos ao pleito com a vitória nas mãos. Tenho a consciência tranquila. Fiz o que devia e o que poderia fazer.
O mesmo não poderão, talvez, dizer os que se acumpliciaram para ver-me derrotado, sem pensar que não estavam vencendo um homem mas, quem sabe, destruindo, uma coletividade. Ou, pelo menos, impedindo, por vários anos, a sua prosperidade. Confesso que não sei ainda o que fazer com a minha derrota. Em compensação, parece que o adversário também não sabe o que fazer com a sua vitória. Estamos ambos perplexos e mais ainda o Espírito Santo. Reflito sobre as palavras de um escritor patrício: “Não se promete para faltar, não se anuncia para desdizer, não se jura para negar e renegar nessa hora em que a Nação, antes descuidada, hoje desesperada, não tem mais indulgências para os que causam a sua perdição ou a sua maldição”.
Aguardemos, pois, o que nos trará o futuro. De ânimo sereno e guardando, com sinceridade, os mesmos puros ideais.
Com recomendações a Ivone e filhos e à boa D. Mariana, receba os meus renovados agradecimentos e o meu
Cordial abraço
[In Cartas selecionadas – Jones dos Santos Neves. Vitória: Cultural-ES, 1988.]
Jones dos Santos Neves graduou-se em Farmácia no Rio de Janeiro e, de volta a Vitória, casou-se, em 1925, com Alda Hithchings Magalhães, tornando-se sócio da firma G. Roubach & Cia, juntamente com Arnaldo Magalhães, seu sogro, e Gastão Roubach. A convite de interventor João Punaro Bley, em 1938 funda e dirige, juntamente com Mário Aristides Freire, o Banco de Crédito Agrícola (depois Banestes), tendo depois disso seu nome indicado juntamente com o de outros dois, para a sucessão na interventoria. Foi então escolhido por Getúlio Vargas como novo interventor, cargo em que permaneceu de 1943 a 1945. Em 1954 retomou seu trabalho no banco, chegando à presidência, sendo, em 1950, eleito governador do estado. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)