59 anos, nasceu em Cachoeiro de Itapemirim e desde os onze anos mora em Vitória. É músico, atuando na noite capixaba, e funcionário público, trabalhando no Centro. Reside atualmente em Mata da Praia. (19.09.2005)
– Vitória é um resultado bom. Inclusive não sou contra a verticalização da cidade já que se verticaliza arquitetonicamente em outras cidades e aqui, por ser uma ilha, tem-se que conviver com isso. Tem que se respeitar a paisagem, não tampar os morros como o do Cruzeiro; do Convento da Penha, só se visualiza a construção, o morro já não se vê mais. Do sudeste é uma das cidades mais bonitas.
– O trânsito, no pico, é caótico, mas flui nos horários intermediários. Como os pontos são de curta distância acho que se poderia atender a população melhor através da via marítima. Seria uma maneira de desafogar, atender as pessoas que trabalham, que moram na região das Caieiras, irem para Camburi. Eu não consigo vir de ônibus trabalhar e venho de carro sozinho. Agora não vou fazer parceria com outras pessoas pra quebrar minha individualidade, essa coisa também tem que ser respeitada. Seria melhor se eu ficasse quieto numa lancha lendo as primeiras notícias dos jornais. Vê lá nos países do Oriente, nos própios EUA, se utiliza muito o transporte marítimo. Nossa estrutura está se deteriorando por uma causa que corre na justiça, o aquaviário. Por que o catraieiro não parou de trabalhar até hoje? Porque tem demanda, ele é organizado. Agora, o serviço de táxi aqui é bom, eu uso muito, principalmente à noite. Os carros deveriam circular mais, eles ficam muito parados e esse negócio de separar vaga pra táxi, em porta de hotel, por exemplo, é o fim. Eu não entendo por que eles não circulam, vivem cheios de regalias de liberação de impostos. Abre um hotel e já abrem faixas enormes pros táxis. Você não tem onde estacionar e fica sem vaga.
– O capixaba é aberto sim, abre as portas de sua casa, eu pelo menos sempre fiz isso, nunca me decepcionei. Ele é menos desconfiado do que o mineiro. O capixaba sempre gostou de adular o cara de fora, e, muitas vezes, o indivíduo dava um rombo na praça e ia embora. Hoje, já temos um status no qual a gente não se assombra mais, não se deslumbra mais, já podemos exigir mais. Ele agora tá mais seleto. O capixaba tem certa autoestima, mas não é exagerado não, ele é meio tímido. Acho porque está sendo descoberto agora. Antes ele se sentia um tampão. Hoje ele está se valorizando. Agora mesmo li na Gazeta uma crônica da Elisa Lucinda, uma maravilha. O pessoal antigo, Menescal, Nara, a novidade deles era o eixo Rio – São Paulo, uma ignorância de quarenta, cinquenta anos atrás. Citação de ser capixaba era o Rubem [Braga], que tinha orgulho. Por aqui tinha, ou tem, aquela coisa do siri na lata, que um não deixa o outro sair e o projeto Camburi, que quer dizer eu entro com o pau e você entra com areia, eu finco o pau na sua areia, faço barraca do regozijo, isso não tem nada a ver. As nossas belezas têm que ser vendidas muito caro. Agora, me deixa falar, sabe o que é a cara de Vitória? O Convento da Penha. Ta lá do outro lado, mas a gente podia puxar ele pra cá. Ele foi feito pra gente olhar, foi feito pra Vitória, olha que a frente dele é pra Vitória.
– O nosso aeroporto hoje é totalmente inadequado. Ele deverá ser melhorado pra ser de ponta inclusive pra atender nossas exportações. Ele é muito tímido. Eu vejo turista em Vitória, mas acho que Vila Velha chama mais o turismo pra eles. Nossa hotelaria tá crescendo, mas é mais pra negócios. Eu como músico da noite há quase quarenta anos vejo que temos boas casas, excelentes restaurantes, comida maravilhosa. O serviço é que é lerdo porque o capixaba é meio lerdo, e tem muita pessoalidade no serviço; se o garçom gostar de você ele lhe serve bem, se não gostar você vai ficar esperando. E os preços são razoáveis pelo serviço, de acordo com o que rola por aí. Prostituição pra quem busca, encontra pelas ruas, mas hoje a prostituição tá meio eletrônica, né? Tem uns pontos aí em Camburi, mas nunca fui um denuncista da sacanagem, mas o capixaba não liga não, é tolerante, quanto aos homossexuais. Hoje em dia tudo mudou muito, tem melhorado.
– Os jornais de segunda-feira, por exemplo, só trazem crimes horríveis. Mas são sempre longe de Vitória. Eu acho que tenho muita sorte. Nunca presenciei, nunca me envolvi com essas questões. Confesso que não presto atenção se tem polícia nas ruas, tem alguma coisa sim. O negócio é que a criatividade da marginalidade é muito veloz. Eu nunca fui incomodado com essa coisa da violência, mesmo trabalhando na noite.
– Em Vitória tem muito idoso, mas ele sai pouco na rua. A terceira idade tem pouca atenção, mas está crescendo, tá tendo forró à tarde, muita discussão, acho que tem muito velho feliz por aqui. Tudo evolui. A mulher, por exemplo, você já vê uma mulher capixaba mais independente, saindo sozinha, quer dizer, vai a um bar sozinha, com outras amigas. Estão se livrando da canga.
– Os itens que envolvem a comunidade, a segurança, a educação, a saúde, ficam devendo porque o que se projeta e planeja não é cumprido, pois o que se lesa do erário, nessa questão dessas rubricas, é uma coisa impressionante. É um assalto constante, fraudes uma atrás de outra. Tive uma experiência na família precisando recorrer a um hospital público em caso de emergência. Cheguei lá, estavam em greve, no São Lucas. O atendimento foi uma coisa pessoal, pois sou conhecido, o neurologista me atendeu, mas o povo sofre. Tinham que atender ao pessoal da Grande Vitória. Vem muita gente de fora, até da Bahia, de Minas. Os hospitais estão superlotados. Dá uma tristeza na gente.
– O capixaba se diverte muito nos parques, o da Cebola, por exemplo, é uma beleza. Tem a Praça do Papa que toda semana tem evento, às vezes até sem cobrança de ingresso. Temos quatro teatros. As praias são problemáticas, pois estão sujas. Agora você vai ter que pagar uma conta de água altíssima em função dessa despoluição que já foi financiada pelos bancos mundiais. Não entendo. A própria siderurgia aqui polui muito. Mas a cidade é bem tratada, limpa, os gestores de um tempo para cá demonstraram gostar de Vitória e eles cuidaram bem da cidade. Tem uma festa que é a cara de Vitória que é a procissão dos barcos de São Pedro.
– O peixe aqui é caro, mas o capixaba não deixa de comer, pelo menos uma vez por semana, e o povão come peixe porque ele aceita um peixe mais barato, mais rejeitado pela classe média. Mas ele come mesmo é o feijão com arroz, uma carne, uma couvezinha. Nós temos muita influência da comida mineira. Agora o peixe tá ficando caro devido à exportação que hoje em dia tá acontecendo por aqui. E pra pescar por aqui, na ilha, já não bate tanto peixe como antes. Bate um jeriquiti, uma corvina, um barbudo, um roncador.
– Nosso esporte é meio ruim, o futebol é ruim, quer dizer, mal administrado. Já tivemos grandes times de vôlei, basquete, grandes remadores, mas hoje em dia, não sei não, confesso que tenho dificuldade de lhe dizer qual o esporte seria a cara de Vitória. O esporte náutico tem aquelas regatas do Iate que nunca pararam. A gente deveria explorar mais o mar. Temos equipes de pescadores de bom tamanho, mas acho que pescaria é mais lazer. O remo sim, até hoje é bem a cara de Vitória, mas tá rareando.
– Pra Vitória eu diria pra ela crescer muito, se verticalizar… Nossos arquitetos têm muito bom gosto. O Marcelo Vivacqua, o Bebeto, o Mendonça, eles preparam bem Vitória. Quando você chega pelo mar e vê Vitória, é uma das coisas mais lindas que existe. Vitória melhorou muito. Agora você já não chega pela Ilha do Príncipe, por exemplo, você tem a Terceira Ponte, uma coisa linda.
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