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A.L.R., gestora cultural

27 anos, gestora cultural, nasceu em Vitória, morou em Vila Velha, hoje mora e trabalha no Centro da cidade, há três anos. (28.10.2008)

– Morei toda minha vida em Vila Velha; estou em Vitória há três anos. Em relação a Vila Velha, Vitória está muito na frente em tudo: cultura, trânsito, limpeza, saúde etc. Não estudei aqui. Trabalho aqui. Gosto da cidade sim.

– Com relação ao trânsito, eu tinha moto até metade deste ano, mas vendi. Tenho muito medo de trânsito. Qualquer um. Porém, em relação às cidades mais próximas, Vitória tem um trânsito bem organizado, sinalizado, tem policiamento normal, muitos ônibus… Os motoristas é que são iguais em qualquer lugar e sempre me assustam. Na verdade, o trânsito é o que mais me assusta na atualidade, pois as outras formas de violência, como roubo, assassinato etc., são cometidas normalmente por criminosos, mas acidente de trânsito onde pessoas ficam machucadas e muitas morrem, na maioria das vezes são provocados por pessoas “comuns” que poderiam ser nossos tios, primos, pais, irmãos. Isso é o que me assusta! Um pai muitas vezes tem medo da filha sair com quem ele não conhece. Medo do que pode acontecer a ela, mas não deixa de pegar um carro, no fim da tarde, cansado, estressado e andar como um louco, impaciente ou beber em um bar e depois dirigir alcoolizado pondo a vida das pessoas em risco.

– Em relação às cidades vizinhas temos boas opções culturais, mas comparando com os estados vizinhos, não muito. O que me parece é que as coisas só funcionam de uma forma. Teatro: enche quando vem uma peça de fora. Show: se tiver alguém de fora com certeza enche mais, mas é uma realidade que parece estar mudando aos poucos. Cinema: só pra rico, pois é muito caro em minha opinião. Casas noturnas: só pra jovens baladeiros. Infelizmente quase não tem bares onde possam acontecer shows. A cidade continua com a mentalidade de música ao vivo, aonde as pessoas vão para bater papo e quem sabe ouvir uma música. Além disso, quase nenhuma casa noturna tem sonorização própria e se o artista não tiver a sua, tem que alugar, o que torna inviável as constantes apresentações. O couvert [artístico] é sempre pequeno. As casas que têm sonorização própria na maioria das vezes não repassam 100% do couvert, pois dizem que têm custos com o som. Os lugares públicos de divertimento, como, por exemplo, a Estação Porto – no armazém 05 do cais –, têm uma acústica muito ruim.

– Não sei dizer na verdade se o capixaba é solidário ou não, amigo etc.. Sei que capixaba não é tão aberto quanto o carioca, por exemplo. Nós ficamos desconfiados quando um estranho puxa papo. Em relação a ser amigo e solidário, acho que capixaba quando é amigo, é amigo mesmo, mas não é de ficar fazendo coisas pra quem conhece pouco. Porém, não sei se é uma característica das pessoas daqui. Talvez seja sim. Lembro-me uma vez em que eu estava no Rio de Janeiro, dentro de um ônibus, e fiz uma pergunta pra um rapaz sobre onde eu deveria saltar. Ele foi super-receptivo, mais do que eu estou acostumada. Passou-me várias informações e no final me deu o número do telefone dele dizendo que se eu precisasse de qualquer coisa poderia ligar. Achei a princípio que ele estava me cantando, mas depois percebi que estava mesmo sendo solidário. Não vejo isso acontecer por aqui.

Não vejo muitos turistas não. Acho as pessoas daqui despreparadas para atendê-los. Ontem mesmo eu estava no McDonald’s e um estrangeiro chegou lá. Ele encontrou muita dificuldade de ser compreendido. Não tinha ninguém lá que falasse inglês. O surpreendente é que a lanchonete fica ao lado de um hotel cinco estrelas em um bairro nobre da cidade! Pra um turista circular bem por aqui, tem que estar acompanhado, senão ele terá bastante dificuldade de se locomover, pois tem pouca sinalização e informação em geral.

– Existem muitas realidades dentro da mesma cidade. O Centro da cidade, por exemplo, onde eu moro, acho sempre sujo, mal cheiroso e um tanto abandonado. Não acontecem muitas coisas aqui. À noite no Centro quase não tem opções. Já nos bairros “nobres” como Praia do Canto parece até que estamos em outro estado. Quanto às pessoas que andam pela rua, depende muito do bairro. No Centro, durante o dia circulam todos os tipos, mas é difícil ver uma pessoa considerada rica andando pelo Centro. Em relação aos moradores, tem bastante idoso e famílias, principalmente os comerciantes locais. O samba é visto com frequência nas calçadas dos bares. Já bairros como Praia do Canto, Mata da Praia, se vê pessoas de um nível financeiro melhor, mais bem vestidas, lojas bonitas, bares modernos etc. Os jovens são mais modernos, estilosos. Em relação aos jovens, o mesmo acontece em Jardim da Penha, que tem a UFES muito próxima e podemos ver os jovens universitários circulando.

– Não posso dizer por todo mundo, mas na minha família tradicionalmente se comia peixe todo sábado. Não é um hábito que mantemos até hoje. É coisa do tempo do meu bisavô que resistiu até a época de uma tia-avó minha, mas acho que hoje só faz comida em casa sempre quem tem filhos. As pessoas correm muito. As mulheres não são mais donas de casa. Sobre o peixe, existe esse hábito sim. Não necessariamente com o peixe só, mas com mariscos em geral. O caranguejo mesmo tem um público fiel e assíduo. Os pasteizinhos também. Em Vila Velha vejo mais este hábito acontecendo. Os quiosques de Itaparica estão sempre cheios e os restaurantes de mariscos também. Lá o peixe é mais popular. Aqui em Vitória, parece que é mais comida de rico. Na verdade, sair pra comer marisco não é um programa barato. Moqueca, por exemplo, é muito caro. Mal dá pra ir comer em duas pessoas, que dirá com a família. Se não fosse por isso, acho que seria ainda mais forte este hábito.

– Quanto às festas, cada uma tem seu lugar. Aqui não é como na Bahia, que é tudo muito junto. O que fica meio misturado aqui é o congo, que tem a homenagem a São Benedito. A Festa da Penha também. Fora isso, não sei, parece que não tem muitas festas na cidade. Existem eventos que envolvem shows, como a Feira do Verde, mas não temos muitas festas folclóricas em Vitória. O congo mesmo é forte na Barra do Jucu (Vila Velha) e em Cariacica. Festas abertas ao público são poucas.

– A imagem da cidade que vem à minha mente é o Penedo na Avenida Beira Mar. Meu lugar preferido na cidade? Não sei. Um lugar que gosto de ir sempre que posso é no Parque da Fonte Grande. Meu lugar preferido normalmente é a praia, mas sempre acabo indo em Vila Velha, pois acho mais bonita e tenho mais intimidade. Gosto de ir ao fim do dia, ou à noite, sentar na areia, olhar pro mar, mas não faço isso aqui em Vitória. A praia não me atraiu, sabe! A paisagem mais bonita é a vista da cidade quando estamos em cima da Terceira Ponte e a Beira-Mar onde tem o Penedo. Toda a orla é bonita. A cidade está muito bonita, limpa, iluminada. A orla de Camburi está linda. Todo o percurso vindo da Terceira Ponte para o Centro da cidade, pela Beira-Mar, é muito bonito. Uma característica que a cidade tem e que me fascina é a mistura de montanha e mar. As pedras enormes que saem de dentro do mar. É muito lindo mesmo! Posso chamar Vitória de Beleza.

– Espero que Vitória caminhe no bem, na honestidade e que incentive isso nas pessoas. Infelizmente, o jeitinho brasileiro, motivo de tanto orgulho pra uns, pra mim é o que nos destrói. Pro brasileiro o legal é ser esperto: furar fila, entrar de graça em um evento pago, colar na prova, comprar CD e DVD pirata etc. Se eu pudesse aconselhar Vitória, eu diria que ser esperto não é isso. Ser esperto é conseguir tudo o que quiser, sendo honesto. Isso sim é ser esperto, pois poucos conquistam as coisas assim.

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