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Capítulo II – Na Leopoldina e estudante em Vitória

Escola paroquial. à esquerda, padre Parensen e à direita o Prof. Kosciuszko Leão. Vitória, 1908.
Escola paroquial. à esquerda, padre Parensen e à direita o Prof. Kosciuszko Leão. Vitória, 1908.

Meu pai era ferroviário por índole. Nunca sonhou em ser agricultor. Podia ter sido latifundiário de terras feracíssimas. O Estado vendia terras a dois mil réis o hectare, até o limite de uma sesmaria de légua, isto é, sete mil e tantos alqueires. Toda a margem da linha férrea em construção, excluindo-se os núcleos coloniais italianos, era devoluta e em mata secular. “Seu” Derenzi já veio ferroviário da Itália e morreu, depois de sessenta anos no Brasil, sempre construindo estradas. A época da greve dos operários da Vitória a Minas coincidiu com a retomada da ligação ferroviária Matilde-Cachoeiro de Itapemirim, pela Leopoldina, companhia inglesa. A celebrada Estrada Sul do Espírito Santo, iniciativa do Governo Muniz Freire, com a finalidade de ligar Vitória a Cachoeiro, estancou em Matilde, município de Alfredo Chaves, quando da crise de 1900.

Meu pai foi o primeiro tarefeiro admitido pelo famoso engenheiro Caetano Lopes, chefe da construção. Acampou à margem da ponte sobre o rio Benevente, que logo adiante, 500 metros talvez, se despeja em belíssimo salto de mais de sessenta metros de altura. Foi um sorriso em nossa angustiosa vida de garimpeiros. Depois do salto belíssimo, a paisagem que o rio descreve — erodindo espigões cobertos de quaresmeiras e samambaias, em contraste com o prateado das embaúbas, o verde escuro dos cafezais em pequenos talhões, o milharal em desordem, as casas de colonos de tanto em tanto, com seus telhados agudos ora de zinco, ora pintados a zarcão, ora de tabuinhas negras de caruncho, aquelas capelas devotas com sineiras em torres piramidais — empresta um bucolismo tranqüilo ao povoado que estacionara com a crise do café do fim do século e com a paralisação da construção da estrada de ferro.

Dividia-se em Matilde Velha e Matilde Nova, onde por primeiro se localizaram os italianos, a uns três quilômetros acima da cachoeira. Matilde era distrito e centro de convergência de outros núcleos a nordeste. Meia dúzia de casas, igrejinha, venda, padaria, da qual Dona Matilde era a padeira. A escola construída pelos colonos foi fechada pelo governo, que lá instalou a delegacia de polícia, porque a professora, coitada, lecionava em italiano.

A Matilde Nova esboçou-se junto à ponte e à estação da estrada de ferro, que se chamava Engenheiro Reeve, em homenagem póstuma ao profissional inglês, tocaiado com dois tiros de espingarda. Vinha de Iriritimirim, última parada, na época, trazendo doze contos de réis para o pagamento dos operários. Ainda teve tempo de salvar o dinheiro, atirando a maleta numa ramada de espinhos arranha-gato.

Eram poucos os moradores de Matilde Nova. O guarda-chaves, Seu Batistella, casado e com filhas, hospedava seu superior hierárquico, Pedro Sposito, agente da estação. A família de maior nomeada era a de Giacomo Provedel. Influente negociante e homem prestativo foi também Ângelo Modulo.

Havia o armazém do Lisandro Nicoletti, comprador de café e grande proprietário, estabelecido em Vitória, cujo gerente, em Matilde, era o ferreiro mecânico Aurélio Mainardi. Certa vez Lisandro Nicoletti foi tocaiado por um bando e só escapou porque se fez de morto, depois de receber mais de dez tiros. Só perdeu o animal de sela. Tempos depois tentaram saquear-lhe a casa de negócios.

Não foi só o atentado ao engenheiro Reeve que perturbou o sossego da pacata colônia de italianos; oriundos de Treviso, Udine, Beluno e Cremona, chegados de 1880 a 1890, eram boa gente. O distrito contava 370 famílias e foi perturbado várias vezes por bandos de jagunços. De quando em quando os italianos se assustavam. Habitualmente moravam nos fundos de seus estabelecimentos comerciais e a peça mais importante era a cozinha, onde a família se movimentava. Enquanto as panelas, em meia fervura, cozinhavam as iguarias, as zelosas paronas tricotavam ou costuravam, com suas máquinas manuais, as roupas dos maridos e das crianças.

Foi assim que, uma tarde, dois jagunços de carabina a tiracolo penetraram na cozinha, onde certa senhora ocupava-se em seus afazeres domésticos. Ela não se perturbou, continuou rodando sua máquina e respondendo às perguntas dos facínoras:

— A senhora tem fazenda preta? Então vai cosendo vestido de luto, porque vai ficar viúva, daqui a pouco.

A mulher se fez de desentendida. Em dialeto vêneto, preveniu seu filho de dez ou doze anos, dando-lhe instruções com toda a calma:

— Toi, prende la escopeta — uma Winchester —, portela a to pare e che venga subito.

Mandou os negros se abancarem e serviu-lhes café.

Não ficou viúva. Cinco minutos depois, o marido, com dois tiros certeiros, prostrou os malfeitores.

* * *

Numa manhã luminosa e fresca de abril, o menino, todo vestido de novo, na sua marinheira azul de galões brancos, botinas de ataque, cabelos cortados à escovinha, franjinha pouco acima dos olhos, e rodamoinho rebelde, que o Galerani não conseguiu dominar, mas prometera vencer se usasse sua pomada por dois meses, teve uma alegria desconcertante. Chegara a Vitória vindo de Matilde, da ponta dos trilhos da estrada de ferro, onde seu pai era tarefeiro da construção. Era tabaréu. Fora criado no meio dos operários e seus companheiros, filhos deles, eram os únicos semelhantes que conhecia. Não gostou do hotel. Chegara com a mãe, de trem, e teve um medão danado ao atravessar de Argolas para o Porto dos Padres, de bote lotado, a baía, que lhe parecia imensa, com marolas que os remos do Furta-Moça, acionados pelo Júlio, cortavam com firmeza… No Hotel do Rocco, no largo da Conceição, tomou banho frio, num latão esquisito, que se chamava banheira e não gostou porque o sabão ficara talhado, dando-lhe nojo. Estava habituado ao banho de rio, junto à ponte, pouco acima da cachoeira. Uma beleza! Areia dourada e lambaris miudinhos a fazerem-lhe cócegas. Gostou da cidade. Teve medo dos soldados: aquela farda azul com galão vermelho ao longo das calças, espada na cinta, dólmã de botões dourados. Espaventou-se um pouco. Lembrou-se do quadro de sua casa, da batalha de Solferino, que seu pai pendurava sempre na parede. O quadro era uma oleogravura de um encontro entre os exércitos italiano e austríaco: tiros, cavalos empinados, sangue, mortos e feridos. Mas atraíram-no as ruas, com mercadorias expostas e, em particular, as farmácias com suas ânforas verdes e amarelas; nunca tinha visto frascos tão grandes e bonitos.

E os sinos, ao badalarem pela manhã e à tarde, lembravam-lhe o mês de maio em Matilde. Os da Matriz, de manhã, repicavam compassados chamando o povo, as beatas, para a missa das seis. Achou os de São Tiago mais sonoros e graves. Foram trazidos pelos jesuítas, diziam. Os da Matriz, pelos portugueses. Ele não sabia quem eram os jesuítas. Português sim. José Silva, o mestre de obras e sua turma, que trabalharam com o pai, o Serafim, eram todos portugueses e muito amigos.

Às seis da tarde os sinos tocavam lentamente, tristes, compassados. Quase todos se benziam: eram as vésperas, as Ave-Marias.

Dois dias depois da chegada, dona Marieta o levara a Vila Velha, na lancha Carlos Alberto, do Eugênio Neto. Embarcaram no Éden-Parque, ali pertinho do hotel.

— Vamos visitar a Madonna da Penha. Vamos rezar para seu pai, para a Pinoia — apelido de minha irmã Angelina —, e para a Madonna proteger você nos estudos. Você vai ser doutor!

A viagem de lancha não o intimidou, mesmo depois de passar o Penedo e as ondas se encresparem um pouco. A Carlos Alberto ia cortando o mar, abrindo bigodes nas águas, cujas marolas iam morrer nas margens em cadência regular.

— Olha a casa da imigração: os imigrantes quando vêm da Itália ficam ali muito tempo, esperando serem levados para as matas!

Ao passar pela pedrona em cima de duas outras pedras pequenas, o motorista disse:

— É a pedra dos Ovos. Aquela cruz de ferro, foi um padre que morreu afogado. Dona Marieta se benzeu e o menino ficou indeciso, na dúvida não se benzeu.

Afinal atracaram. Viram a gruta de frei Pedro Palácios, o pórtico e os mendigos.

O menino, anos depois recordando o fato, conta aos amigos: “O portão era muito velho. Meu pai falava das antiguidades de Roma e suas ruínas fabulosas. Eu fiquei imaginando como seriam elas, pois a que estava à minha frente despertou-me a imaginação para uma época que eu ainda não sabia descortinar.”

Ao transpor os umbrais, junto com vários outros visitantes, muitos dos quais se descalçavam, inclusive sua mãe, o menino ficou com o coração doído de ver a quantidade de velhos e aleijados a pedir esmolas. As esmolas eram dadas em vinténs. Aqueles infelizes, ao recebê-los, agradeciam com jaculatórias piedosas e alvissareiras. A subida íngreme, ensombrada, com seu pavimento de alvenaria irregular, desdobrava-se por entre uma florida e perfumada floresta em miniatura. A mãe subiu rezando e ele escorregando sobre o limo do pavimento. Cipós, bromélias, flores, pássaros familiares, formigueiros e lagartixas. De quando em quando uma réstia de sol dava um banho de ouro no cenário e via-se, como se fora uma chaminé, o ar a subir pelos raios que se escoavam pela abertura da galhada. Uma festa para os olhos.

Atingiram o pastinho. Uma esplanada em ferradura, inclinada suavemente, desnuda de vegetação, sobre a qual se eleva a penedia, em cujo topo se assenta o santuário de Nossa Senhora da Penha, a padroeira venerada dos capixabas.

Descansaram na subida. Suores enxutos, rostos e vestes recompostos e o primeiro sguardo da paisagem deslumbrante: no noroeste distante, o Mestre Álvaro, azul forte, com a mataria entreaberta de lavouras, o recorte desordenado da serra sem alinhamento. Depois os camarás de Carapina a se confundirem com os mangais que margeiam a ilha de Vitória.

Refeitas as forças galgaram, mãe e filho, as escadarias de pedras toscas até o patamar da casa dos romeiros, inacabada, para ganhar fôlego para o último estirão: o lanço final de entrada do santuário bendito. Mais uma visão da cidade pelo quadrante sul, a lendária Vila Velha, pequena, confundindo-se com as árvores frutíferas, e o mar a fugir para o Jucu, com sua franja branca a beijar a praia da Costa, Itaparica, ponta da Fruta. Areias, arbustos, lagoas e o rio da Costa a se espreguiçar manhoso, antes de lamber Piratininga, abandonada. O Moreno com suas semáforas, solitário, vigiando os baixios de pedra e o oceano azul ferrete onde passam os navios ao largo.

O menino respirou fundo, abobalhado e aturdido.

A capela sombria com dois candelabros acesos recendia a cera queimada e incenso. Os olhos da Virgem, a iluminar todos os corações devotos, pareciam estrelas a luzir do seu altar bonito, de cedro talhado.

Ajoelharam-se, Marieta orou como se fosse uma santa, no paraíso, falando à sua mãe. As lágrimas rolavam de seu rosto lindo.

O menino rezou bastante e teve o êxtase da estupefação. A riqueza do ambiente o confundiu e o intimidou. A mãe rezou ao pé de todos os altares. Ergueu-se compungida, segurou o filho pela mão e percorreu a galeria dos milagres com respeito e admiração. Tomou novamente água benta, molhou a testa do filho e desceram para o pátio dos peregrinos, onde tomaram café com broa de milho.

O retorno se fez bordejando mais o lado norte da baía, gentileza do motorista. As ilhas do Frade e do Boi, em capoeirão, salpicadas de cássias floridas, receberam olhares alegres dos romeiros.

* * *

Amanheceu bonito o dia seguinte. Marieta, de terço e sombrinha à mão, vestida de saia de seda furta-cor, blusa de linho branco e gola de musselina, cordão de ouro, longo até a cintura, cabelos fartos e castanhos penteados em topete grosso, arrematados em coque preso por três travessas de tartaruga, saiu cedo para a igreja do Rosário, ali pertinho, só pequena caminhada e subir a escadaria de um só fôlego, com seus trinta e dois anos de italiana vigorosa, sem ser gorda. Só rezou o terço, não houve missa. O filho ficou espantando urubus nas poças cobertas de detritos da praça Costa Pereira.

— Pronto, — disse, — agora vamos à escola.

Foi pequeno o percurso. Tomaram a rua Pereira Pinto, viram o Éden-Parque com gente à espera do vaporzinho para Vila Velha, o grande armazém do Nicoletti estava fechado. Desceram a rua Primeiro de Março pelo lado do mercado, muito aglomerado nesta hora. Em frente ao Hotel Europa, de Caetano Vello, dobraram à direita e subiram a ladeira da Matriz, pedregosa e escorregadia. Atravessaram a rua Duque de Caxias. Subiram mais cem passos e dobraram à direita tomando a rua das Flores, cuja placa, meses depois, no sobrado da esquina, o menino aprendeu a ler: rua Dionísio Rosendo.

Na quarta morada, de dois pavimentos, com sacada de frente, protegida por gradil de ferro batido e peanhas de vidro azul, lado de cima, entraram.

Percorreram pequeno corredor escuro, subiram dois lances de escada e bateram à porta do pequeno vestíbulo desnudo. Era um velho prédio do começo do século XVIII, telhas vãs de beiral arrematado por cimalhão de tábuas, algumas despregadas. Aparecia a pingadeira livre, cinza claro, pintura velha e esquadrias azul desmaiado, craquelês, dobradiças de ferraria.

Dona Marieta bateu com leveza à porta principal.

— Bom dia! Vim matricular meu filho no Colégio Amâncio Pereira pero creio ter me sbagliato. É uma casa de família. Desculpe-me, sim, per piacere.

— Minha senhora, eu sou o professor Amâncio Pereira, a escola é aqui mesmo mas hoje é feriado, é dia de Tiradentes, porém podemos matricular a criança agora. Entrem por favor.

Abriu a porta. Era a sala de aulas. Um sofá de jacarandá, duas cadeiras de encosto oval, escarradeira e um consolo reto com uma jarra azul cheia de galhos de crista de galo grená. Relógio na parede, quadro-negro, mesa retangular de vinhático suportando tímpano, palmatória, tinteiro com duas bocas e um livro de capa mole, com o canto direito todo arrebitado. Vários bancos, algumas cadeiras, duas ou três estantes que tanto poderiam servir de escrivaninhas como encosto para leitura.

O professor Amâncio Pereira abriu o livro de folhas arrepiadas, em determinada página, escreveu um número na margem, na coluna seguinte escreveu 37 e perguntou o nome, data de nascimento, local, filiação e residência.

— Como? Mora no Hotel Rocco?

— Sim. Nós viemos de Matilde. Meu marido é ferroviário e o menino precisa estudar. Vai ficar no hotel.

— Sozinho?

— Sim. Nós não temos parentes na cidade. Meu marido trabalha no interior.

Foi feita a matrícula.

— Amanhã, às oito, começam as aulas. Ele deve trazer o Primeiro livro de leitura, de Felisberto de Carvalho, um caderno, caneta, tinteiro, uma lousa para cálculos e lápis. A senhora pode comprar ali na rua do Sacramento, na Casa Manoel Braz. — E apontou lá para baixo, para o lado do largo da Conceição.

Despediram-se com todas as cortesias de estilo.

O professor Amâncio tinha justa fama de educador. Homem de cor, muito querido. Era só bondade, inteligência e patriotismo. Gostava de narrar episódios do tempo da escravatura. Conhecia como pouca gente a história capixaba. Tinha inclinação para a literatura teatral e escreveu diversas comédias infantis com lindas melodias. A 13 de maio desse ano o novo aluno fez parte do coro e cantou o estribilho que jamais saiu da memória:

Hosanas, glórias, triunfos
E, à luz da redenção
No vasto solo brasílio
Acabou a escravidão!
A frase musical era muito melódica.

Comprado o material escolar, no dia seguinte, por segurança, Dona Marieta acompanhou o filho até a ladeira da Matriz, hoje rua Cerqueira Lima, e foi fazer compras na Flor de Maio, de Nametala Paulo & Irmão, à rua da Alfândega, esquina com ladeira da Misericórdia. O menino entrou encabuladíssimo na escola, principalmente porque não conhecia ninguém e a botina esquerda, além de rinchar, lhe estava a machucar o pé mal acostumado ao sacrifício. Eram os alunos, na maioria, meio palmo mais altos do que ele, com o sotaque característico dos ilhéus que atiraram uma série de piadas desconhecidas e deram-lhe o apelido de “gringo pé-bruto”. De fato o menino era baixo, cabeça grande, botina Clark número 34, comprada na Casa Morgado Horta, no cais do Imperador, na subida da velha escadaria do Palácio. No linguajar não nasalava os graves e os erres eram doces demais. Fizeram uma algazarra infernal. Os únicos acomodados eram os três maiores, já quase rapazes, os negros Adão Macedo e Júlio, o da verruga no nariz, e o branco de cabelo cacheado, Ciro Pitanga. O Júlio gritou grosso: — Deixa o menino!

Abriu-se a porta da sala de jantar e o professor entrou de fisionomia severa.

— Que barulho é esse? Nunca viram um menino do interior?! Sentem-se! Temos mais um aluno.

E disse o nome do novato, relatando o episódio da matrícula com carinho e simpatia.

O apresentado chorou e os companheiros se compadeceram. Às onze horas do dia 23 de abril de 1908, o tabaréu ouviu sua primeira aula.

Fora alfabetizado em Baunilha por João Barbeta, prático de farmácia da Estrada de Ferro Vitória a Minas, um jovem simpático e distinto que, ingressando na Polícia Militar, com pouco tempo, galgou o posto de major e foi, por muitos anos, ajudante de ordens de vários presidentes de Estado. O menino, pelo visto, não era de todo analfabeto. Retraído e briguento, não suportava que os colegas rissem dele.

* * *

O Hotel Rocco não passava de uma casa de pasto, na velha terminologia do começo do século. Situava-se na esquina da rua General Câmara com o largo da Conceição. O nome de General Câmara dado ao beco marinho, em homenagem ao herói da guerra do Paraguai, só tinha dois imóveis: a oficina de Pietro Buzatto e o hotel. A rua não passava de ancoradouro de canoas que, nas marés baixas, exalava fedentina terrível. Esses chãos estão hoje ocupados pelo Palácio do Café.

Rocco Ferrer, napolitano temperamental, viera de Manaus trazendo a reboque Margarida Tibone, que era loura de olhos verdes e bem mais moça do que ele, e tão hábil na arte culinária quanto seu companheiro. As refeições aos domingos e duas santos eram disputadas pelos estrangeiros e notadamente pelos italianos, numerosos então em Vitória.

A sala de refeições era simpática. Uma só mesa para doze comensais. Um canapé e duas poltronas de jacarandá. Dois consolos com tampo de mármore Carrara e jarras. Espelho veneziano, tamanho grande, encimando o toalete, no qual repousavam o jarrão e a saboneteira policromadas por figuras Luiz XV. Um belo lampião belga, preso ao teto por três correntes metálicas, iluminava fortemente a mesa e sua campânula emprestava ao ambiente sombra repousante.

O jantar era servido à francesa por Dona Margarida, de toalete festiva. À cabeceira sentava-se o Rocco, de croisé e gravata de laço grosso, tendo à direita o padre Hermenegildo Battaglia, secretário do Bispado, e sua irmã, mensalistas distinguidos.

O escolar não tinha assento fixo na mesa, ocupava o último lugar e quando os comensais eram muitos ficava para o fim, comendo prato feito. Mas ele gostava de sentar-se à mesa para ouvir as conversas: política, imigração, melhoramentos da cidade e o progresso do Rio de Janeiro, acionado pelo Dr. Pereira Passos. Quando o padre Hermenegildo faltava, o assunto era outro: mulheres. Ouvia tudo, prestava atenção principalmente a Rocco a relatar histórias de Manaus e Belém. Borracha, castanha, penas de pássaro, companhias líricas, artistas famosos. “E Vitória, esta sujeira…” — arrematava ele, que fora enganado em vir para esta terra. Deveria ter seguido para São Paulo.

Um negociante de Araguaia, com seu acento vêneto, atalhou:

— Dottore Girolamo vai melhorar a cidade.

— Com que denaro? O café não vale nada. Todas as obras de Muniz Freire pararam! O Teatro Melpômene está fechado e apodrecendo.

— Dottore Girolamo Monteiro vai consertar. Já vendeu a Estrada de Ferro para os ingleses e vai arranjar mais dinheiro.

— Se Dio voglie, — exclamou Rocco.

O menino quieto, mudo, recebia de vez em quando certo carinho da signorina Mafalda, irmã do padre, simpática e devota. Era milanesa, solteirona e vivia com o irmão. Passava o dia bordando e fazendo merletti com que ajudava o magro orçamento fraterno. Morava em casa de família modesta, na Cidade Alta, e tinha pouca companhia. Bordando, costurando e pedindo ao padre que se fossem embora. Quando vinham famílias do interior ela se distraía a recordar o Scala e o Duomo de Milão, sua terra. Era simpática, elegante e pobre. Assim era o Hotel Rocco, onde se comiam ricas iguarias e se bebiam o barbera, o lambrusco e o chiante, importação de Lisandro Nicoletti.

Agonizava o quadriênio de Henrique Coutinho. A crise econômica era desesperadora e Jerônimo Monteiro uma dúvida na perspectiva do futuro que se aproximava. Os prognósticos eram cochichados no Éden-Parque e no Café 15 de Novembro, junto à farmácia Aguirre.

Dias depois, numa tarde bonita, quando o menino voltou da escola, encontrou o pai na oficina de Domingos Monteiro. Ganhara novo trecho, muito maior, de Engano a Guiomar, e o prazo era curto. Precisava de muito transporte para a terraplenagem e viera comprar mais carroças. E uma surpresa: o menino iria morar com a família do dono da marcenaria. Mudou-se e teve quarto com cama limpa. Dona Mariquinha afeiçoou-se ao pequeno e a primeira providência foi matriculá-lo na Escola Paroquial dirigida pelo padre Luiz Parensen, alemão, da Congregação do Verbo Divino. O ambiente era melhor. Os alunos regulavam todos à mesma idade, e havia muitos do interior: Euclides Grau, Abel de Almeida, este de São Mateus e aquele de Santa Teresa, e outros tantos. Melhor convivência e pátio para recreio.

Domingos Monteiro, lusitano meão, forte, bigodes tratados à Dom Carlos, usava vocabulário um tanto impróprio para menores. Sua amiga, Dona Mariquinha, simpática e enfeitada, fora recrutada no Rio de Janeiro, na rua da Conceição, onde se vendiam amores a três mil-réis. Quando discutia, sua linguagem fazia com que as janelas se cerrassem por cortesia aos vizinhos de frente. A rua Duque de Caxias sempre foi estreita, principalmente no trecho da ladeira da Misericórdia. Mas o casal vivia bem e era generoso para com os oficiais da carpintaria, no rés-do-chão, com frente para a rua da Alfândega. O menino teve ocupação agradável. Exercitou-se na arte em que São José foi mestre e Jesus aprendiz. A oficina era toda manual. Muitas máquinas não haviam sido inventadas e Vitória era iluminada a lampião. Ali mesmo na esquina da Misericórdia havia um que causara boa surra ao Tonico, filho do Cardoso, por ter quebrado o vidro da lanterna a pedrada.

A ladeira, agora, era trafegada diariamente pelo menino, quando demandava a escola. Subia, dobrava à esquerda, tomava a rua Santos Pinto e bordejava o Palácio. A Escola Paroquial funcionava na sacristia da Igreja de São Tiago e o auxiliar de ensino era o Kosciuszko Leão, abusando de sua juventude. Quem aplicava os bolos de palmatória era o Gervásio Pimentel, bom sujeito que faleceu como diretor do expediente da Secretaria de Educação. O menino agora andava cuidado e aos domingos ganhava um tostão.

Quem lucrou foi o tabuleiro de Dona Maria Saraiva, que teve novo freguês: as guloseimas, cocada, pé-de-moleque, pamonha e casadinhos custavam de um a dois vinténs. O ponto ficava na subida do Palácio, junto ao Morgado Horta. O Zé e o Manduca, seus filhos, eram maus fregueses: tapeavam sempre no troco e o caixeirinho ia para casa chorando.

A escola paroquial era convidativa. Os meninos tinham como pátio de recreio os fundos do Palácio. As ruas Francisco Araújo e Duarte Carneiro, residências de gente velha e humilde, tinham muitos terrenos baldios com árvores frutíferas, onde a garotada brincava de pique e “soldado-ladrão”. Os jogos prediletos eram o de bola de gude e pular carniça. Um dia o menino levou meia dúzia de bolos mandados aplicar pelo jovem Kosciuszko. O menino decepara, dias antes, a ponta do indicador direito. Foi acidente de trabalho. Estava Clotário Passos a serrar com a serra de voltas, um lambrequim, cujo molde estava colado na prancha de madeira. A serra ia seguindo em suas curvas ornamentadas. Cabia ao menino limpar o pó produzido pela serra. Numa dessas limpezas, o dedo se atrasou e a serra, “zup”, levou a cabeça do indicador. Só doeu de noite, mas o dedo inchou. Quando estava quase bom, a palmatória interrompeu a cura. Congestionou o indicador e supurou. Ficou da grossura de uma banana nanica. Dona Conceição virou onça. Foi à escola, disse algumas verdades e, fazendo apelo ao vocabulário portuense, mandou os professores a lugares pouco salubres. Não foi preciso dispensar o discípulo. Ele não voltou mais. O Dr. Lordello não amputou o dedo, mas o cheiro forte de iodofórmio dos curativos afetou toda a casa do Sr. Domingos Monteiro. E o menino de dez anos, lendo o Tico-Tico e o Fafazinho, ficou aprendendo marcenaria. Já envernizava e empalhava cadeiras. Experimentou passear de bonde puxado por dois burros. O trajeto se fazia da rua do Comércio até o Forte de São João e seguia as únicas vias trafegáveis: Primeiro de Março, Pereira Pinto, Costa Pereira, Rosário, Cristóvão Colombo, Barão de Monjardim. A velocidade era o trote, mas nas subidas da Primeiro de Março e da Barão de Monjardim o trote reduzia a passo, apesar do chicote do condutor. O veículo tinha quatro bancos e era aberto, com cortinas de oleado para proteger da chuva. O condutor se defendia das intempéries usando capa de borracha. Não havia pára-brisa. No Forte de São João, Humberto Ranzatti montou um botequim com bebidas finas, num caramanchão de sapê. À noite, mariposas sem asas ajudavam o consumo da cerveja. Os domingos e dias santos eram das famílias, que passeavam depois do sol posto. A moral rígida ficava assim ressalvada.

A vadiagem durou pouco. A reforma da velha casa de Instrução Pública, efetuada por André Carloni, terminara. O velho sobrado fora mandado construir pelo presidente da província, Dr. José Tomé da Silva, em 1872, mas a falta de recursos só permitiu ao Dr. Elísio de Souza Martins terminá-lo em 1874. Um sobrado insípido, sem proporções, sem nenhuma estética. Restaurado e ampliado pelo Dr. Jerônimo Monteiro, na sua nova arquitetura abrigou a Escola Modelo e Normal, sob o calor da reforma de ensino, responsável pela luz meridiana que iluminou a criançada capixaba. Nosso herói matriculou-se no segundo ano primário, aos cuidados da professora Dona Olga Coutinho. Madrugou então para a vida comunitária. Eram mais de trezentas criaturas de ambos os sexos. Conheceu a família espírito-santense. Não se sentiu mais só. A disciplina pedagógica o acordou para a alegria de viver. Marchar, cantar, brincar, transmitir as lições da véspera, o nome no Quadro de Honra, tudo isso criou-lhe um novo mundo de interesse.

E veio o fim do ano. Exames, parada escolar, teatro, boletim de promoção, férias.

* * *

Foram esplêndidos os dias passados em Guiomar, que os ferroviários chamaram “Cinqüenta e Nove”, porque dista 59 km de Matilde.

A produção, desde Matilde até Vargem Alta, em plena serra, desbravada pelos colonos italianos, imigrantes do Vêneto, não procurou mais os portos de Guarapari, Piúma e Anchieta: desceu pelo traçado custoso da Leopoldina, ex-Sul do Espírito Santo. E os negócios de Duarte Beiriz, Pedro Aboudib e outros entraram em agonia lenta mas fatal. Porém os colonos obtiveram melhor preço para seus produtos e a zona serrana tomou alento temporário. As terras frias não foram propícias aos cafezais plantados aos soluços e promessas a Nossa Senhora do Caravaggio. As férias foram memoráveis. O escolar encontrou novos companheiros, Tancredo e Raul, e os caminhos das colônias foram varridos em montarias trotonas.

O acampamento da obra situava-se no quilômetro 54, pouco antes do vértice da serra, onde se captou água deliciosa e fresca para abastecer as locomotivas e se inicia o declive para o vale do Itapemirim. O trem parava para tomar água e os passageiros desciam para chupar uvas ou tomar um horrível café comprido, vendido por uma velha italiana, acolitada por duas lindas meninas ruivas de lenços amarrados às cabeças. Vestidos desbotados e longos até os tornozelos.

Uma tragédia horrível aconteceu no acampamento, que muito impressionou os três escolares em férias.

Certa manhã, “Seu” Serafim encontrou um antigo operário que não via há muitos anos.

— O que você está fazendo aqui pelo serviço?

— Esperando o senhor passar e pedir o favor de me enterrar amanhã. Aqui está o dinheiro. — E, ato contínuo, entregou-lhe uma cédula de vinte mil-réis.

— Você já está bêbado, Manoel Vila Nova!

— Não, senhor, eu sei que vou morrer.

O homem estava nervosíssimo. Olhar esgazeado, boca espumante, atitudes de forasteiro, usava traje domingueiro e sapatos novos. Não era conhecido na região. Fora operário de meu pai na Vitória a Minas. “Seu” Serafim apanhou a nota, esporeou o Marimbo e continuou a percorrer o trecho em demanda da turma do Zé da Silva, mestre de obras de arte. Manoel Vilanova aproximou-se do acampamento. Era um longo barracão de paredes embarreadas, que numa extremidade era ocupado pela moradia; seguiam-se o almoxarifado, a oficina, o depósito, o escritório e o armazém de fornecimento ao operariado. Circundava-o a esplanada com as estacas onde se amarravam as tropas e os animais de montaria. A empreitada era tocada pelos sócios Joaquim Miranda, português, meão, robusto, malcriado e valente, e Serafim Derenzi, italiano, maneiroso, alegre e trabalhador, querido e respeitado pelos operários. Florêncio Coelho, genro de Miranda, fora proprietário de um quiosque na rua do Comércio, à beira-mar. Era homem mau e já tinha adormecido vários catraieiros e policiais em seu sórdido botequim. Gerenciava, agora, o armazém. Vilanova viu Dona Marieta na bica d’água. Pediu-lhe água e bebeu no caneco, dois litros de um só fôlego. Foi ao armazém e quis comprar dinamite, mas não conseguiu porque a venda era expressamente proibida. Sumiu.

Na hora do almoço, numa longa mesa de vinte pessoas, Serafim contou o encontro da manhã e Marieta, o da bica d’água; Bilé identificou o comprador de dinamite:

— É um louco.

Os escolares temeram encontrá-lo pelos caminhos. O tempo passou. Caiu a tarde. Acenderam-se os lampiões. Findara a jornada, os operários e suas mulheres aguardavam, à porta, que os armazém se abrisse para o fornecimento. Alguns esperavam vales de adiantamento nos guichês do ponto.

Eis que Vilanova surge inopinadamente, abre a porta do guichê do Miranda e o acomete de punhal em punho. O compartimento era pequeno, não havia espaço para defesa. Miranda espremeu o agressor com o pé direito contra a parede do tabique e se deitou. O punhal mal lhe alcançara o peito. Foi ferido várias vezes até a chegada de socorro. Foi Zé da Silva. Com um golpe de foice na cabeça prostrou o traiçoeiro, com o punhal cerrado na mão direita. Arrastaram-no para o terreiro.

Não houve como arrancar-lhe o nome do mandante. Florêncio Coelho decepou-lhe a mão com a machadinha, para tirar o punhal. Miranda rugia como um leão ferido, enquanto Dona Joaquina, sua mulher, aplicava-lhe compressas de azeite quente nos ferimentos. Tancredo e Raul, pálidos de emoção, choravam em silêncio. Dona Marieta rezava à imagem de Nossa Senhora de Pompéia, enquanto seu filho não largava o pai.

Enquanto essa cena se desenrolava, no terreiro Zé da Silva procurava por todos os meios obter a confissão do assalariado, que negava obstinadamente. Confiou-o, então, aos trabalhadores já encachaçados. Reduziram-no a um corpo amorfo.

No dia seguinte, “Seu” Serafim pagou os vinte mil-réis para enterrar o Manoel Vilanova. Na curva do cafezal, a poucos metros, num buraco mal cavado, enterraram o homem de cabeça para baixo e pés de fora. “Seu” Serafim reclamou a falta de humanidade. Os coveiros improvisados deceparam os membros do infeliz e os enterraram ao lado. Com as chuvas de fevereiro o mato nasceu de novo e o local voltou a ser o que era antes.

* * *

A terceira classe teve como regente o professor Arnulfo Matos, diligente, esforçado e de apreciável cultura geral. Novos discípulos. Na maioria bem apresentados e muito aplicados. Leonardo Gélio com seu costume branco, deveres bem feitos e sabendo as lições na ponta da língua. Alceu Vieira, habilidoso, com ternos variados e bizarros. Ari Grijó, brutamontes, desbocado, mas apartador de brigas, generoso, e o mais forte da turma. Era o campeão de corrida.

Aulas objetivas ministrava o querido professor Arnulfo. Lições de Coisas, noções de Cosmografia, de História, de Religião e de Música. Seu forte era o complexo sistema de pesos e medidas. Grãos, espigas, onças, arrobas, litros, quartilhos, alqueires e quartas. Episódios da escravatura e da vinda dos imigrantes. Instrutivo e interessante. Nosso menino mostrou muita habilidade na homogeneização desses complexos. Mau leitor e bonita caligrafia. Porém mal cuidado: botinas descorticadas, carrapichos pela roupa. Agora era hóspede de Pietro Zangrandi, um viajante italiano de basta cabeleira, bigodes a cobrir-lhe a boca, pince-nez. Sua mulher, de João Neiva, bem mais jovem, Amabile, amamentava uma rubicunda e rosada menina. Morava em Jucutuquara, na chácara do Barão, no morro fronteiro ao hoje estádio do Rio Branco. Era longe. O bonde a burro, sem horário, custava 200 réis. O menino, por precaução, fazia a caminhada a pé, por um difícil e perigoso atalho. Subia pela fazenda do Fradinho, atravessava a mata do divisor de águas da rua Sete de Setembro, descia pelo sítio dos Bastos e tomava a rua Coronel Monjardim, então Capelinha. Dobrava o cruzeiro de São Francisco e, pela rua Muniz Freire, ganhava a praça João Clímaco, fronteira ao palácio. Contornando, entrava no recreio da Escola Modelo. Era um estirão e muitas vezes chegava molhado e enlameado. No estômago, um magro almoço feito às oito e meia com a máxima parcimônia. O Sr. Zangrandi saía a viajar e passava semanas sem dar notícias. A mulher não tinha como se virar. O menino tinha saudades dos cuidados de Dona Conceição Monteiro e, mais ainda, das bacalhoadas e das papas à portuguesa. Foi um ano duro o de 1909. Zangrandi, quando viajava pela Zona da Leopoldina, trazia dinheiro e mercadorias das colônias. Era a forra. Mas o ano passou e novas férias vieram.

Em Vitória o reboliço era enorme. Falava-se em tanta coisa que Jerônimo Monteiro estava fazendo! Muita festa, muita gente. Navios no porto. Nas ruas, homens de fraque e chapéu coco, carroças e carroções carregados de pedra, tijolos, madeira. Uma confusão geral.

* * *

Pelo trem das quatro e meia, veio de Matilde “Seu” Serafim e, dois dias depois, com mais roupa e outra botina amarela, o menino e seus amigos Tancredo e Raul lá se foram em férias para Guiomar. O trem corria pouco, as rodas rangiam nas curvas e cada junta dos trilhos solancava com um “trutuque” enjoado. Na estação de Viana tomaram café com bolos de arroz, vendidos pela mulher do agente. Partiu o comboio, depois de longa demora, e na caixa d’água, em Jucu, enquanto se reabastecia, chuparam mangas. Com velocidade reduzida o trem seguiu, batendo caixa. A rampa e as curvas amarravam a corrida. O vale do Jucu é uma beleza! Corredeiras, árvores enormes, embaúbas, palmitos, bois pastando nas encostas descorticadas pela erosão! Os meninos conversavam, comiam bolos, faziam planos e lembravam-se do Vilanova com certo receio. “Não, não aconteceria mais nada.”

Passaram os túneis, receberam muitas fagulhas nos olhos e venceram as estações de Germânia, Domingos Martins, Marechal Floriano, Rio Fundo e Araguaia, úmida e garoenta. Com o Sr. Lorenzoni à espera de jornais, Iriritimirim, parada rápida e, finalmente, alcançaram o vale do Benevente.

[DERENZI, Luiz Serafim. Caminhos percorridos — Memórias inacabadas. Reprodução autorizada pela família Avancini Derenzi.]

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Luiz Serafim Derenzi nasceu em Vitória a 20/3/1898 e faleceu no Rio a 29/4/1977. Formado em Engenharia Civil, participou de muitos projetos importantes nessa área em nosso Estado e fora dele. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)

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