56 anos, natural de Vitória, atriz, radialista, reside em Camburi e trabalha em Mário Cipreste.
– Eu amo morar em Vitória. A cidade está crescendo, está limpa, bonita. Pena é o trânsito, porque não tem pra onde fluir. A cidade se limitou por ser uma ilha. Acho que as coisas vão piorar; vão ter que arranjar um jeito que eu não sei qual. A segurança também está péssima. A gente não vê polícia nas ruas, nem os guardas municipais que ficavam na orla de Camburi, pois eles estão em greve porque os coletes à prova de bala deles estão com validade vencida. Fui assaltada há algum tempo em Jardim da Penha; as pessoas têm que se precaver, evitar ficar dentro do carro parado em porta de prédio. Aqui em Mário Cipreste, por exemplo, há muito assalto, mas eles respeitam a gente, pois sabem que a gente trabalha aqui, senão… Tem muito crack pela redondeza. Tem cracolândia perto da Rodoviária, aqui em frente ao Carmélia, onde estão os carros alegóricos estacionados, ali na Volta do Rabaióli. Hoje os jovens estão todos voltados pro crack, não só pessoal de periferia, mas também os de classe média. O crack chegou e tem até filhos de conhecidos que estão envolvidos – é uma droga terrível. Há meses atrás, um conhecido, classe média alta, da Praia do Canto, usou tanto que foi indo, foi indo e morreu escravo da droga, subnutrido, em pele e osso. Não tenho frequentado a noite, mas sei que o crack está presente hoje em dia.
– Vejo turistas sim pela cidade, tanto os de negócios como os de lazer. A cidade é cara, os restaurantes são caros, as casas noturnas, mas é o que eles têm pra fazer. Pra nós moradores é impossível juntar uns amigos e degustar uma moqueca nos restaurantes. É impossível, é muito caro. Até pra gente comer em casa algum pescado, mesmo que somente no final de semana, é puxado. Saiu uma matéria semana passado no jornal comparando os preços dos peixes e mariscos da Ilha das Caieiras, onde todos os restaurantes pertencem a pescadores locais, e constatou que os preços praticados por eles era o dobro do cobrado em restaurantes em Camburi, por exemplo. Uma churrascaria oferece muito mais. E os turistas têm os shoppings, que atraem muita gente. Só que o capixaba não sabe dar orientação nas ruas, pois ele não conhece os nomes das ruas: é sempre do jeito referindo-se que o prédio é perto de tal padaria, ou em frente do banco tal, ao lado daquela estátua que não sabe de quem é, etc. Lamentável é a falta de espaços culturais, um bom teatro, mas também a atividade cultural está aquém do desejado, está tudo muito capenga, sem qualidade, seja na música, no teatro, apesar dessas leis de incentivo. Já estivemos muito, muito melhor. Há muita falta de interesse. O universitário hoje é muito desinteressado e desinformado: sinto isso pelos estagiários que passam por aqui. Toda fonte de informação deles é a internet, a única. Há muita futilidade e desinformação, de dar dó. A gente nota que vêm da faculdade sem saber nada.
– Ah, o capixaba discrimina muito. Tenho um colega que tem a pele bem morena, mas não deixa de transparecer seu repúdio aos negros, ao congo, ah, falou que é congo ele arrepia… O capixaba diz que não é racista, mas ele é sim. Ele não é muito acolhedor. Na periferia ele é mais aberto, mas na classe média ele prefere pesquisar primeiro pra se abrir. Ele resiste. As pessoas têm medo de conversar umas com as outras.
– Se as escolas municipais começassem a ensinar um pouco de nossa história talvez fôssemos diferentes. Ninguém conhece nada. Maurício de Oliveira, falecido recentemente, era um ilustre desconhecido por todos os estagiários de comunicação que atuam aqui na emissora. Eu perguntei a um deles: você é de Vitória? Não, sou de Jucutuquara, respondeu. Agora, os professores da rede pública também não têm direito à informação porque eles não têm dinheiro pra comprar um jornal – o salário deles é péssimo. E não têm tempo pra entrar na internet pra pesquisa, ou numa biblioteca. Tem professor que não tem computador em casa, o trabalho deles é muito puxado, sobra pouco tempo. É triste. O que eles poderiam passar pras crianças… Com a saúde é mesma coisa, os postos são péssimos. Graças a Deus não precisei ainda. Um colega nosso aqui tinha câncer de próstata e esperou um ano e seis meses do sistema público pra cirurgia, mas não conseguiu, morreu.
– O Convento da Penha é a cara de Vitória. Adoro também o morro que tem as torres de televisão, na Fonte Grande – lá você deslumbra-se com o visual que Vitória oferece. Pena que a segurança não ajuda. Fizeram vários decks pra você parar o carro e curtir, mas quem tem coragem? E o medo de ser assaltado? Mas que é lindo é. A Curva da Jurema é maravilhosa.
– Um alerta: já aterramos, aterramos, e agora os prédios estão subindo, subindo, os monumentos estão desaparecendo, o Convento da Penha, a pedra de Fradinhos, só tem prédio, prédio, não há referência no horizonte. Eu gostaria que meu filho tivesse horizonte e não só prédio pra se ver.
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