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No reino do rei reinante

Elenco da peça No reino do rei reinante, escrita por Tércio Moraes e dirigida por Maura Moschen. A peça foi encenada nos teatros Galpão e Carlos Gomes em 1997. Foto jornal A Gazeta, 16/02/1997.
Elenco da peça No reino do rei reinante, escrita por Tércio Moraes e dirigida por Maura Moschen. A peça foi encenada nos teatros Galpão e Carlos Gomes em 1997. Foto jornal A Gazeta, 16/02/1997.

Peça infantil escrita em 1970 por Tércio Ribeiro de Moraes

Inscrita na Sociedade Brasileira de Autores Teatrais

Encenada em:

1970 – No Teatro da Associação Espírito-Santense de Imprensa por um grupo amador, do qual o autor fez parte.

1970 – No Teatro Carlos Gomes, com a direção de Milson Henriques.

1980 – Pelo Grupo de Teatro Ponto de Partida, em Vitória, em várias cidades do interior do Espírito Santo, e em vários estados.

1997 – Apresentada pelo grupo de teatro Companhia de Artes Cênicas em Vitória.

Personagens

O Rei
O Ministro do Lado de Dentro
O Ministro do Lado de Fora
O Ministro Geral
O Ministro Real
O Ministro Irreal
Os Guardas da Panela
Carregadores
O Mágico
A Bruxa
O Anunciador

Anunciador – Vai-se realizar neste instante a oitava reunião da Corte do Reino do Rei Reinante. Serão seus participantes: o Ministro do Lado de Fora (Entra e senta); o Ministro do Lado de Dentro (Entra e senta); o Ministro Geral (Entra e senta); o Ministro Real (Entra e senta, após dar um tapinha na barriga do Anunciador); o Ministro Irreal, que aliás não existe. E agora acaba de chegar, para presidir a reunião, o Rei. (O Rei entra, os Ministros se levantam, e sentam junto com o Rei. O Anunciador sai.)

Rei (Em pé) – Senhores Ministros: em minhas viagens pelo mundo, aconteceram coisas estranhas com vosso Rei (Descalça a bota e mostra.) Vejam, senhores Ministros, a minha bota está furada.

Os Ministros (Espantados) – OOOOOOOHHH! A bota do Rei está furada! OOOOHH!

Rei – É preciso solucionar este problema. (Grita) Ministro Geral! (O Ministro Geral estava fazendo bolas de sabão e para assustado.)

Ministro Geral – O quê, Majestade?

Rei – O que o senhor sugere?

Ministro Geral – Majestade, é preciso industrializar o nosso reino, e assim conseguir dinheiro para consertar a bota. O nosso reino deveria construir fábricas de bolas de sabão em todo o território, que assim ficaria coberto de bolas de sabão. (O Ministro fala de pé a parte final, entusiasmado e fazendo bolas de sabão. Todos gostam, menos o Ministro do Lado de Fora.)

Rei – Ministro do Lado de Fora!

Ministro do Lado de Fora – Sim, Majestade!

Rei – Que acha disso?

Ministro do Lado de Fora – Majestade, eu acho que não é nada disso. Nós precisamos é ouvir a opinião do Ministro Irreal. (Todos olham para a cadeira do Ministro Irreal, em silêncio.)

Ministro do Lado de Dentro – Não concordo, Majestade. Nós precisamos é mandar a bota para o Sapateiro Real.

Todos – Sim, o Sapateiro!

Ministro do Lado de Dentro – É… mas precisamos de dinheiro para pagar o Sapateiro.

Todos – É… dinheiro, não temos dinheiro.

Ministro Real (Depois de pensar um pouco) – Ah!! Já sei, vamos chamar o Mágico!

Todos (Gostando da ideia) – Muito bem! Ótimo! Viva!

Rei (Ao telefone) – Alô, é da Seção de Astrologia? Mandem um mágico aqui na sala real. Depressa. (Os Ministros ficam brincando na sala real – brincadeiras infantis. São interrompidos pela entrada de carregadores, transportando uma enorme caixa.)

Um carregador – É aqui a sala real?

Ministro do Lado de Fora – É aqui mesmo.

Rei – Coloque aí neste canto. (Os carregadores colocam a caixa no chão e saem. Os Ministros continuam brincando, até notarem a caixa. Começam, então, a examiná-la. O Mágico pula de dentro da caixa com um grito, tentando assustar os Ministros, mas frustra-se. Os Ministros aproximam-se dele, cumprimentando-o. Sentam-se ao seu redor.)

Rei – Ah! É o Mágico. (Fica andando de um lado para o outro, preocupado.)

Ministro Real (Falando baixo) – O Rei está preocupado.

Ministro do Lado de Fora – Sim, preocupado… Ele está com um problema.

Mágico – Problema…

Rei – A minha bota está furada. É este o atual problema do Reino do Rei Reinante.

Ministros (Falando baixo) – Sim… a bota do Rei está furada.

Mágico – OOOOOOOHHH! A bota do Rei está furada… OOOOOOHHH!

Rei – Sim, a minha bota está furada, e precisamos de dinheiro para consertá-la.

Ministros – Sim, precisamos de dinheiro.

Mágico – Dinheiro… (Todos ficam em expectativa) A panela!!

Todos – Panela? Mas o que tem a ver panela com dinheiro? Nós precisamos é de dinheiro.

Mágico – A panela está cheia de dinheiro!

Todos – Ahh! Aí sim…

Rei – Mas… onde está esta panela?

Mágico – A panela está no fim do Arco-Íris.

Ministro do Lado de Dentro – E onde fica o Arco-Íris?

Mágico – O Arco-Íris fica na Região das Pedras Coloridas.

Todos – Oba!! Que bacana, esse lugar deve ser muito bonito!

Mágico (Consulta o relógio) – Dentro de três minutos e oito segundos vai parar de chover… e então vai aparecer o Arco-Íris. Preparem-se para partir.

Rei – Então vamos!

Todos – Vamos! Oba! (Cai a coroa do Rei e ele ordena a algum dos Ministros que a apanhe, fato que deverá acontecer mais vezes. Depois que todos saem, entra a Bruxa, entre espantada e indignada.)

Bruxa – Ora essa!.. Quer dizer que o Rei está fazendo mais uma de suas histórias e nem me chamou, hein? Onde já se viu história sem Bruxa? Toda história que tem Rei e tem Mágico tem que ter Bruxa também, ora. Quer dizer que o Rei quer consertar sua linda bota, hein? Pois bem, quero ver só! Pois eu vou enfeitiçar esta panela e quero ver quem vai abri-la depois. (Aproxima-se da panela e faz gestos de magia.) Abacadabra, fechacadabra, fechapanela!! Esta panela só será aberta por mim, a Bruxa!! (Sai rindo.)

(O Rei, os Ministros e o Mágico estão procurando o Arco-Íris, inclusive por entre a plateia.)

Ministro Real (Apontando) – Achei, vejam. (Todos veem, e se aproximam do início do Arco-Íris.)

Rei – Vamos segui-lo até o final. (Vão andando devagar, apontando. No fim do Arco-Íris há uma grande panela. Perto dela estão os Guardas da Panela, que, agachados, cobertos por suas capas, não podem ser vistos pelo Rei, ou pelos Ministros. O Rei tropeça na panela.) Vejam, a panela!

Todos (Alegres) – Viva!! A panela, nós a achamos!

Ministro do Lado de Dentro – Vamos levá-la.

Rei – Ministro Geral, pegue a panela e vamos!

Ministro Geral – Sim, majestade. (Quando o Ministro Geral toca na panela, surgem os Guardas da Panela, que são identificados por cores.)

Guarda Verde (Gritando) – Não toquem na panela!

Guarda Amarelo – Esta panela é do Rei do Arco-Íris, vocês não podem levá-la.

Guarda Azul – Sim, ninguém pode levá-la.

Rei (Amedrontado) – Mas… nós só queríamos vê-la.

Ministro do Lado de Fora – É tão bonita!

Guarda Amarelo – É por isso mesmo que não podem levá-la. (Os Ministros e o Rei se afastam. Todos andam, desanimados, pelo palco.)

Rei – Desse jeito nunca vamos conseguir dinheiro para consertar minha bota…

Ministro Real – Encontrei a solução. (Todos olham atentos.) É só jogar fora a bota furada e ficamos livres do problema. (Todos gostam da ideia, menos o Rei.)

Rei (Ainda desanimado) – Não, não dá certo. Eu nunca consegui andar com um pé só, quanto mais com uma só bota!! Eu cairia toda hora. (Todos desanimam de novo.)

Ministro do Lado de Fora – Ah, é mesmo, não havíamos pensado nisso. O nosso Rei manca de uma bota… que pena.

Ministro Geral (Entusiasmado) – E se vendêssemos a bota que não está furada? Assim, conseguiríamos dinheiro para consertar a bota que está furada! (A ideia é aplaudidíssima por todos. O Ministro do Lado de Fora levanta-se, apanha a bota, e começa a vendê-la.)

Ministro do Lado de Fora – Vamos vende-la para os Guardas da Panela.

Todos – Isso mesmo, vamos. (O Ministro do Lado de Fora se aproxima dos Guardas da Panela e os outros observam em expectativa.)

Ministro do Lado de Fora (Cutucando o Guarda Amarelo) – Ei, acorde! (Ele olha para a bota espreguiçando-se.) Veja esta bota de couro de jacaré, comprada no exterior. Não quer comprá-la? (Ele acena negativamente e encolhe-se de novo. Desanimação geral.)

Ministro Real – Olha, você não sabe vender botas. Veja como se faz. (Apanha a bota e cutuca o Guarda Vermelho.) Alô, ei!!

Guarda Vermelho – Ora, não quero saber dessa história de botas. Vê se não enche! (Encolhe-se.)

Rei – Isto é que é vender bota? Vejamos se o Ministro Geral consegue vendê-la. (Entrega a bota ao Ministro Geral.)

Ministro Geral (Dirigindo-se ao público) – Oolha a booota! Quem quer comprar uma bota? (Dirigindo-se, se possível, a um espectador) Você quer comprar uma bota? (No ouvido do Guarda Verde) Oolhaabooota! Quem quer…

Guarda Verde (Levanta a cabeça rapidamente) – Bota? Ei, eu quero, eu quero comprar a bota. (Os Ministros gritam e pulam de alegria. Depois, silenciam em expectativa.)

Ministro Geral (Abaixa e tenta calçar a bota no pé do Guarda Verde) Vamos experimentar. (Todos juntos tentam calçá-la, em vão, machucando o pé do Guarda Verde.)

Guarda Verde (Triste) – Ah… não adianta. É muito pequena. (Encolhe-se, cansado e mancando.)

Ministro Geral (Afastando-se com os outros) – Não adianta, é muito pequena. Ou então é o pé dele que é muito grande. (Todos ficam preocupados e desanimados. Ficam andando de um lado para outro, chocam-se, caem no chão, quando o Ministro do Lado de Dentro tem uma ideia.)

Ministro do Lado de Dentro (Levanta-se, gesticula, fala alto) – Já sei, já sei, ouçam. (Todos se levantam, atentos, juntam-se e cochicham, gesticulando. De repente, o Ministro do Lado de Dentro grita, apontando para o céu.) Olha lá no céu, um disco voador. Olha, olha o disco voador. Olha o disco voador! (Os Guardas da Panela se levantam depressa e correm para perto do Ministro do Lado de Dentro.)

Guardas – Aonde? Cadê? Me mostra… Olha lá… Estou vendo… Veja como brilha. (Enquanto ficam olhando, os Ministros apanham a panela e sorrateiramente saem correndo. Os Guardas da Panela continuam olhando e apontando. Depois param.)

Os Guardas – Oh, oh, sumiu. (Voltam devagar e dão pela falta da panela.)

Guarda Azul – Ei, a panela, eles levaram a panela.

Guarda Amarelo – E agora? O Rei do Arco-Íris vai ficar furioso.

Guarda Verde – Temos que ir atrás deles.

Guarda Amarelo – Vamos recuperar a panela!! (Apavoram-se correndo, chocam-se e caem. Saem correndo. O Rei e os Ministros chegam à sala real, caindo de rir.)

Rei – Enganamos os bobos, ah, ah. (Coloca a panela no chão.) Finalmente teremos dinheiro para consertar a minha bota.

Ministro do Lado de Dentro – Vamos abrir a panela.

Ministro do Lado de Fora – Sim, vamos abrir a panela.

Rei – Esperem, vamos primeiro chamar o Mágico. (Pega o telefone.) Alô, Seção de Astrologia? Manda um Mágico aqui na sala real, depressa. (Coloca o fone no gancho. Os Ministros ficam impacientes.)

Os Ministros – Por que não abrimos logo? Esperar o Mágico nada.

Rei (Decisivo) – Vamos esperar o Mágico. (Todos ficam quietos, mas impacientes. Aparecem, então, os Guardas da Panela, armados de espadas.)

Guarda Vermelho – Veja, a panela. Vamos pegá-la!

Guarda Amarelo – Sim, de qualquer jeito! (Os Guardas avançam e os Ministros e o Rei correm assustados para longe, levando a panela.)

Guarda Vermelho – Dê-nos a panela, vamos! Ela é do Rei do Arco-Íris!

Rei – Não, a panela é nossa!

Os Ministros – Isso, não dê a panela para eles não!

Guarda Vermelho – Nesse caso teremos que lutar!

Os outros Guardas e os Ministros – Isso mesmo, teremos que lutar!

Rei – À luta! (De espada em punho, as partes se chocam e lutam durante algum tempo. No final, todos morrem e caem, amontoados, no chão. Chega então o Mágico, espantado.)

Mágico (Depois de examinar a todos) – OOOOOOHHH! Estão todos mortos! Mas… será que eles conseguiram achar a panela? Onde estará a panela? (Procura a panela com uma luneta e acabar por tropeçar na panela.) Ah, a panela, finalmente achamos a panela… ela deve estar cheia de dinheiro, e eu vou abri-la… Mas… Esperem… No Reino do Rei Reinante ninguém pode ficar dormindo, todos têm de estar acordados. (Bate, levemente, com um bastão, na cabeça de todos, que vão acordando e, lentamente, levantando.) Vejam, a panela!

Todos (Ainda saindo do sono) – OOOOOOOOHHH! (Amontoam-se sobre a panela.)

Mágico – Afastem-se! Vou abrir a panela! (Todos se afastam e o Mágico se aproxima.) Abracadabra… Abrapanela! (O Mágico não consegue abrir a panela e todos reclamam.) Esta panela está enfeitiçada.

Todos – Quem terá feito isso?

Mágico – A Bruxa.

Todos (Levam um susto) – A Bruxa??!

Mágico – Sim, e só a Bruxa pode abrir a panela.

Rei – Então, vamos chamar a Bruxa.

Todos – Bruxa, Bruxa, Bruuuxa! (Aparece a Bruxa, depois de algum tempo.)

Mágico – Vejam, a Bruxa!

Todos – A Bruxa!!

Mágico – Bruxa, abre a panela para a gente!

Bruxa – Eu não. (Todos pedem para ela abrir a panela. Ela se nega.)

Mágico – E se eu te der o pó de pirlimpimpim, você abre?

Bruxa – Não.

Mágico – E se eu te levar à Região das Pedras Coloridas?

Bruxa – Ora, já estive nesse lugar.

Rei – E se você entrar na estória, você abre a panela?

Bruxa – Não sei… Você declara isso bem alto, para todos ouvirem?

Rei – É claro.

Bruxa – Então declara!

Rei (Solene, falando alto) – A partir deste instante, a Bruxa faz parte do Reino do Rei Reinante!!

Bruxa – Agora eu abro. Mas o Mágico precisa me ajudar.

Mágico – Abramos a panela, então!

O Mágico e a Bruxa (Fazendo gestos.) Abracadabra, Abracadabra, Abrapanela. (Abrem a panela, de onde saem bolas de gás, coloridas.)

Todos (Caindo) – OOOOOOOHHH!

FIM

Certificado da Censura Federal do Teatro para a peça No reino do rei reinante. 1985.
Certificado da Censura Federal do Teatro para a peça No reino do rei reinante. 1985.

Jornal A Gazeta, 16/02/1997.
Jornal A Gazeta, 16/02/1997.
A Gazeta, 21/02/1997.
A Gazeta, 21/02/1997.

A Gazeta, 02/03/1997.
A Gazeta, 02/03/1997.


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Tércio Ribeiro de Moraes nasceu em Vitória, em 23 de novembro de 1955, e morreu também em Vitória, em 4 de maio de 2008. Desde cedo dedicou-se à literatura, tanto em verso como em prosa. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui.)

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