Em Dédalo e Sonetos da despaixão, ambos da Florecultura Editores, Miguel Marvilla demonstra que ocupa um lugar peculiar e sui generis na poesia nacional: o de terremoto subterrâneo. Passa a representar, portanto, todo o primeiro mundo, ele, primeiro poeta de um continente perdido por nós — o do sentimento técnico-poético quintessencial.
Pois como podem terremotos que se expõem tão aos sentidos da vista, do tato, da audição, do gosto e da fala, fálica, como podem terremotos quintessentes em direção ao sexto sentido; como podem eles não ser percebidos pelo Espírito Santo-Brasil mais insensível à cultura e à poesia que já tivemos o desprazer de conhecer?
Mas quem se expõe se opõe, como ele, um revolucionário permanente que não perdoa nem a si mesmo, pois se dedica o pior de seu cortante sarcasmo e da sua amargura. Porém a esperança é o melhor que se poder ler e é a única leitura possível no inconsciente reprimido de seus versos contra a sua atitude de lutar por estar vivo e não ter nada de melhor ou de mais belo para fazer na realidade, além de poemar-se.
Porque esta missão de visão ele realiza, segundo as normas de Rimbaud, tornando-se vidente porque o poeta se torna vidente pelo completo “desregramento de todos os sentidos”— e não sejamos avaros: leiamos sentidos em todos os sentidos duplos em quarteto.
Da desgraçada despaixão dedálica, a graça, uma angústia silenciosa, discreta e orgulhosa — ainda que extrovertida — se torna verso de uma originalidade ímpar e mais-que-perfeito-genial.
Boa parte do que escreve foi feito por nós — em pensamento de fôrma de letras e de versos, antes de o serem — parceirosamente, em algum lugar em que definimos nossas normas como existente no espaço entre o fim dos limites do universo e o nada. A recíproca é verdadeira. Ali, ouvintes atentos dos Sininhos das poeiras estelares, compusemos as normas mentais que, de tanto não nos alcançarem, tomaram forma em corrida de cores em prol da brancura enegrorcida que as contém.
Ave, Miguel, os que vão morrer te saúdam! Tu és imortal como tua obra. Mas onde estão as neves emocionais das damas de outrora? Bem que eu te disse que era fria!…
As coisas têm uma equação de palavras. Ninguém pensa além da linguagem. Se nós descobrirmos, como Miguel em suas obras, qual é a equação mais impossível de palavras das coisas, nós teremos a palavra perfeita que abre todas as portas, chave-mestra atrás de que está todo poeta — e teremos todas as coisas. Por trás dela, reflexo em decúbito no espelho, a beleza mostra, nos seus versos, a soma que conduz à perfeição.
———
© 2001 Texto com direitos autorais em vigor. A utilização / divulgação sem prévia autorização dos detentores configura violação à lei de direitos autorais e desrespeito aos serviços de preparação para publicação.
———
Oscar Gama Filho é psicólogo, poeta e crítico literário com diversas obras publicadas.(Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)