65 anos, aposentado, nasceu em Vitória, morou 30 anos no interior de São Paulo, retornou há 3 anos pra o Centro da cidade, local onde nasceu e morou. (03.10.2008)
– Voltei porque fiquei viúvo, tinha muitos parentes ainda aqui, meus filhos casaram e foram morar longe, um nos EUA e outro no Pará. Voltei pra mesma rua da minha infância e quase que pra mesma casa. Agora são edifícios no lugar daquelas casas. Gosto de Vitória, sempre gostei desse jeito calmo e pacífico que parece que não vai mudar nunca. Pelo menos enquanto por aqui eu estiver, tenho certeza. Tenho a impressão às vezes de que me vou encontrar ainda com antigas figuras do meu tempo. E acontece de verdade. Gente da minha geração que não saiu do Centro e lá estão. Talvez por falta de opção, os percalços da vida, uma maneira mais apropriada de sobreviver. A maioria de antigos colegas ou já se foram, ou moram na Zona Norte da ilha, em Camburi, além de muita gente estar agora morando na Praia da Costa, que cresceu muito. Aquela ponte é uma beleza. Acho que Vitória mudou depois da terceira ponte. O que não mudou foi o Centro da cidade. Mudaram as pessoas, mas o Centro conserva ainda um ritmo parecido. Claro que tudo foi pras bandas de Camburi e da Praia do Canto. Mas há muito movimento comercial ainda, mudou o tipo de gente. O que falo é a noite parece continuar a mesma. É como se fosse um bairro, com algumas deficiências. Só não tem cinema. Os teatros estão ali, na Costa Pereira. O Parque Moscoso está uma beleza. Impressionante como capricharam. Tem agora uma casa de shows no porto, de graça, quase toda a noite tem coisa lá. Já passei na porta umas vezes e achei muito tranquilo. A cidade à noite está muito movimentada. Claro que falta uma coisa ou outra, como supermercado. Isso sinto falta. Tem o São José e pronto. Já até comparei alguns preços e descobri que até no próprio São José na Praia do Canto tem coisa mais em conta. Os restaurantes são fracos também, só pra matar a fome de quem está trabalhando. Não se come uma moqueca por aqui. Predomina o churrasco. Já escolhi de ir pra Zona Norte pra fazer compras vez ou outra, bem como comer num restaurante.
– Os passeios também são na Zona Norte. A orla ficou muito bonita e no aterro da Praia do Suá a gente faz belos passeios e nessa nova praia de Camburi também. Ruim são os ônibus, demoram muito e os táxis são caros. Os restaurantes nem tanto, nem os supermercados. Caro aqui é roupa. Impressionante. Roupa e táxi. Ônibus é ruim de pegar. Nunca gostei de dirigir e quando saio com alguém da minha família geralmente vou pra Manguinhos, que é muito bonito, mas sem muito movimento. Prefiro quando vão pra Praia da Costa. Passar pela Terceira Ponte é uma bênção, principalmente quando estamos quase no mesmo nível do Convento da Penha. Quem diria. Por falar nisso como cresceu a Festa da Penha, as caminhadas noite adentro rumo ao Convento. O capixaba é um fiel devoto de Nossa Senhora da Penha. E a Praia da Costa está muito bonita também. Já Vila Velha parece a mesma, assim como o Centro de Vitória. Onde cresceu muito foi Campo Grande, impressionante. Gosto muito também daquela pequena ponte na Praia do Canto ligando o bairro de Camburi, por trás da praia. E lá os motoristas respeitam o pedestre, é automático. Difícil ver isso pelo Brasil. E são limpas as ruas, sem lixo e bem iluminadas, em Vitória de um modo geral. O que me encanta à noite é o Parque Moscoso. Impressionante. Ficou bonito lá. Acho que falta é gente na rua. Parece que têm medo de sair à noite. Sei não, são outros tempos. No parque ficam mais os jovens jogando.
– É isso que eu digo: Vitória cresceu muito nesses últimos dez anos, mas parece que não mudou. Há 20, 30 anos atrás tinha o mesmo número de gente na rua. Cadê o povo? Parece que não gosta de sair de casa. Não creio que os shoppings desviem a multidão das ruas. Acho que o capixaba ficou mais caseiro, com medo de rua. E parece que o idoso, mais que eu, claro, não sai mesmo. Em São Paulo, Campinas, Ribeirão, os sessenta, setentões e mesmo oitentões, participam muito da vida da cidade. O capixaba idoso parece ter vergonha de sua idade.
– A violência aqui não é diferente da que a gente vê no resto do Brasil. Acho até mesmo o Centro muito calmo e tranquilo. Ruim são os pontos que reúnem gente envolvida com drogas, os morros e as periferias. Tudo tem a sua hora e lugar. Estou feliz por ter retornado a Vitória. Percebo é um pouco de falta de cuidado na conservação dos prédios mais antigos. Já as ruas, impressionante. Como são limpas, lembra o sul, Paraná.
– Estou feliz por ter retornado. Custo de vida muito bom, muita calma e tranquilidade. Reclamam muito da poluição, mas confesso que não a sinto muito. A gente ainda sente a brisa do mar em pleno Centro da cidade, e, como disse, depois de tanto tempo, você ainda é surpreendido por personagens que fizeram parte de sua juventude em plena rua, praticamente no mesmo ambiente de antes. Os caminhões pela manhã repletos de verduras e frutas é uma beleza, tudo fresquinho. E ainda por cima tem o pão da [padaria] Expressa. Quanto tempo eles não estão lá? Vitória, o Centro, é ainda uma menina que não cresceu, permanece inocente. O lado maldoso foi pro lado da Praia do Canto e adjacências.
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