Tulo Hostílio Montenegro nasceu em Vitória, Espírito Santo, em 1916, e faleceu em Bethesda, Maryland, em 1996.
Seu pai, o paraense Jonas Meira Bezerra Montenegro (1891-1923), formou-se em Direito pela Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro em 1914, radicando-se no ano seguinte em Vitória, onde advogou e foi catedrático de Português, por concurso, no Ginásio do Espírito Santo. Em 1921 classificou-se em primeiro lugar em concurso para promotor público da capital, onde faleceu dois anos depois, vítima da tuberculose, deixando órfãos seu primogênito, Tulo Hostílio, e quatro filhas: Albalilia, Consuelo, Carmen e Elvira.
Tulo Hostílio começou a trabalhar cedo, para ajudar no sustento da mãe e das irmãs. Foi funcionário do Departamento Estadual de Estatística e, no período de 1943 a 1945, secretário de Governo (função que hoje corresponde à de chefe da Casa Civil) junto ao interventor federal no Espírito Santo, Jones dos Santos Neves. Mais tarde, no Rio, trabalhou no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, tendo participado da organização do Censo de 1950. Voltou a ocupar o cargo de secretário de governo em 1952, de novo a convite de Jones, agora governador eleito. Em 1953 juntou-se aos quadros da Organização dos Estados Americanos como diretor do Centro Interamericano de Treinamento em Estatística Econômica e Financeira, no Chile. Em 1955 foi transferido para a sede da OEA em Washington, D.C., acumulando as funções de secretário geral do Instituto Interamericano de Estatística. Foi também membro e secretário do Instituto Internacional de Estatística. Aposentado em 1981, após 28 anos de serviço na OEA, continuou a viver em Bethesda, Maryland, onde faleceu em 17 de janeiro de 1996, tendo merecido obituário no jornal Washington Post.
Sua qualificação como estatístico pode ser aferida nesta citação: “Ocorrendo, em abril de 1964, o advento de ambiente e condições favoráveis à efetiva promoção de medidas de renovação e estruturação há tanto tempo exigidas, aperceberam-se os novos dirigentes do IBGE da oportunidade de imprimir sentido prático ao encaminhamento das providencias para isso necessárias. Surgiu daí a iniciativa do convite ao Estatístico Tulo Hostílio Montenegro, antigo e competente técnico ibgeano, há mais de um decênio exercendo as funções de Secretário-Geral do Instituto Interamericano de Estatística e de Diretor do Departamento de Estatística da OEA, para vir ao Brasil e, após estudos, pesquisas e entrevistas, traçar um diagnóstico sobre os entraves que vinham entorpecendo o funcionamento do sistema estatístico nacional. Durante o mês de maio de 1964, entregou-se o abalizado técnico à missão que lhe fora confiada, da qual resultou um relatório em que apontava objetivamente os fatores determinantes do desencontro de meios e fins, quanto à estrutura e funcionamento do IBGE, e sugeria as bases de uma reformulação do sistema estatístico nacional. Tiveram ampla e profunda repercussão as conclusões e recomendações contidas no relatório de Tulo Hostílio Montenegro, que afirmava, a certa altura, que o sistema estatístico brasileiro se encontrava, em 1964, em face de um dilema: – Ou, num esforço aparentemente superior à sua capacidade, enfrentava os problemas assinalados e reorientava suas atividades, a fim de produzir as estatísticas de que o País necessitava; – ou, em proporção cada vez maior e em forma descoordenada, essas estatísticas seriam levantadas pelos órgãos da administração pública e pelas entidades privadas que delas necessitavam, tornando-se pouco a pouco injustificável a manutenção do sistema como tal. Aconselhava o relatório, entre outras medidas, a constituição de uma Comissão de Alto Nível para ‘efetuar o estudo cuidadoso dos meios cuja aplicação se requeria para eliminar ou, pelo menos, reduzir os efeitos desfavoráveis dos fatores que afetavam a estrutura e o funcionamento do sistema, e a proposição, aos Poderes Públicos, das medidas necessárias à reformulação de suas bases e à representação de suas atividades’.” [In Isaac Kerstenetzky: legado e perfil, vários autores, IBGE, 2008 (versão online)].
Consulte-se também o terceiro volume da História das estatísticas brasileiras, Estatísticas organizadas, de Nelson Senra, IBGE, 2008 (versão online), onde a atuação de Tulo Hostílio é apreciada às páginas 324, 434, 443, 448, 453, 455, 475, 486, 646, 687, 723, 780, 787-788, 809, e 855-856.
Paralelamente à estatística, Tulo Hostílio foi, desde o ginásio, um apaixonado pela literatura. Jovem ainda, nos anos 30, já exercia a crítica literária em periódicos de Vitória e no Diário de Notícias do Rio. Em 1952 manteve na Vida Capichaba a coluna Cidade das Letras. Movido talvez pela tragédia familiar (a mãe também morrera tuberculosa), Tulo escolheu como tema de sua obra maior a ligação entre a tuberculose e a literatura. A primeira edição de Tuberculose e literatura: Notas de pesquisa saiu em 1949, impressa pelo IBGE, revertendo-se os direitos autorais à Campanha Ibegeana contra a Tuberculose. Sua publicação foi recebida com entusiasmo por parte dos críticos brasileiros da época. Uma segunda edição, ampliada, foi publicada em 1971 pela Casa do Livro, do Rio. A lista da bibliografia consultada abrange 22 páginas. A das apreciações críticas à primeira edição (citações extraídas de resenhas ou de cartas recebidas), dez páginas.
Tulo Hostílio é autor, também, de um ensaio, O problema do livro no Brasil (1953), antes publicado em fascículos no suplemento literário do Diário de Notícias, e de dois estudos ligando estatística e literatura: O comprimento do período como característica estatística de estilo (1955) e A análise matemática do estilo (1956).
Além da literatura de língua portuguesa, Tulo admirava em especial a literatura anglo-saxônica. No Diário de Notícias publicou, em 19 de maio de 1946, uma “Conversa sobre Sinclair Lewis e sua obra”. Em 1952 participou do Ciclo de Palestras sobre Literatura Viva, promovida pelo governo do Estado, com uma conferência sobre Graham Greene, e deixou pronta a primeira versão de um estudo sobre Sherlock Holmes. Até sua partida definitiva para o exterior, Tulo privou estreitamente com o grupo de intelectuais da Vitória da época, entre eles Renato Pacheco, Eugênio Sette, Guilherme Santos Neves, José Leão Nunes e Eurípides Queiroz do Vale.
Sua esposa, Virgínia Dória Montenegro, natural da Bahia, faleceu em 2008. Seus filhos, Fernando José Montenegro, Regina Maria Montenegro Brown, Maria Carolina Montenegro DiSandro, e Raquel Dória Montenegro, nascidos, respectivamente, em Salvador, Vitória, São Paulo, e Rio de Janeiro, radicaram-se nos Estados Unidos, bem como seus netos e bisnetos.
[Pesquisa e texto de Reinaldo Santos Neves]