A morte do Sr. Jones dos Santos Neves, ocorrida ontem, libera para a História o desapaixonado julgamento de sua vida pública. Recolhido à vida privada depois de perder uma eleição majoritária, negava-se a participar da política. A um amigo que lhe cobrara o prometido livro autobiográfico, desculpou-se uma vez com uma resposta antológica: Perdi o interesse pelo personagem.
Mesmo morto, Jones dos Santos Neves não deixará de ser um importante personagem histórico. Embora sua atuação política se tivesse marcado por acirrada oposição, ninguém lhe pode negar um excelente governo. Pela primeira vez em sua história o Espírito Santo recusava o dócil papel de produtor cafeeiro, a que todos os demais benefícios eram negados. No Governo, procurou Jones demonstrar que a monocultura cafeeira não conseguiria arrastar o Espírito Santo ao desenvolvimento e por isso mesmo preconizava a agro-indústria, a diversificação agrícola, a industrialização das cidades.
Foi amado e odiado – como todo político de sucesso. Cultivou com Getúlio Vargas uma grande amizade, sem nunca ter sido trabalhista. Foi popular, sem ser popularesco. Mesmo sabendo que estava perdendo votos, conservava-se Jones até mesmo nos morros onde os assessores lhe pediam um pouco mais de descontração. Esta capacidade de ser ele mesmo, a despeito das conveniências ou das circunstâncias, parece ser uma das mais claras características de sua vida.
Estilista primoroso, deixa alguns discursos da melhor qualidade, onde se pode faiscar o gênio do administrador lúcido e atualizado.
Desde uns anos para cá, Jones afastara-se da vida pública, embora sem deixar os negócios. Amante da pintura, da natureza, seu temperamento seco escondia uma alma sensível e bondosa. As complicações cardíacas não lhe tiraram o entusiasmo e a alegria senão quando o quadro do desenvolvimento da doença não deixava mais haver esperanças.
Jones há de ser lembrado nas telas que pintou, nas obras que realizou, nos discursos que escreveu. Mas o que talvez sirva muito mais como sua recordação é o nosso convívio com o progresso. Tudo o que se passa no Espírito Santo foi sonhado por esse homem com espírito de visionário. “Os frágeis galhos dos cafeeiros” já não sustentam a economia do Espírito Santo. Graças principalmente ao trabalho e à visão de Jones dos Santos Neves.
[A Tribuna, 21 de dezembro de 1973.]
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Alvino Gatti foi escritor e jornalista.