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A Ary Vianna (Vitória, 13/7/1970)

Vitória, 13 de julho de 1970

Prezado Ary,

Não faça mau juízo. O atraso da minha correspondência corre ou correu por conta, exclusivamente, da bruta ressaca pela conquista da Taça Jules Rimet! Lavei a alma, vendo os nossos crioulinhos dando um banho de bola naqueles lourões arianos de além-mar! Preparei-me espiritual e materialmente para assistir às irradiações da Copa. Visitei o gordo (meu cardiologista) para saber se estava em condições físicas de assisti-las. Receitou-me umas pílulas tranquilizantes a serem tomadas uma hora antes do início dos jogos. Adquiri uma TV nova, último modelo, e um possante aparelho de rádio. E parti resoluto para a guerra. Lá pelas tantas, esqueci pílulas e tudo o mais, agarrado ao copo de uísque para vencer a Copa. E venci! Dando berros homéricos a cada gol que saía. Depois de cada partida, ficava até altas horas assistindo à repetição em VT e saboreando as partidas. Comprei um álbum com os gols, todos os nossos, esgoelados por um locutor das arábias! E, ainda hoje, vibro e sonho com o nosso feito heroico. Leio e tresleio o Nelson Rodrigues, o tal de babar na gravata, da saúde de vacas premiadas que inventou mais essa preciosidade na frase de Napoleão: “O que me faltou em Waterloo foi um Jairzinho na ponta direita!” Uma delícia! Mas tudo isto que fiz foi com um certo recato, na intimidade do lar. Ninguém viu, nem soube, que não sou de me promover a custo da Copa, nem de levantá-la sobre a cabeça como um gladiador vitorioso… Deixa pra lá! […] Lembranças a todos e um cordial abraço do

[In Cartas selecionadas – Jones dos Santos Neves. Vitória: Cultural-ES, 1988.]

Jones dos Santos Neves graduou-se em Farmácia no Rio de Janeiro e, de volta a Vitória, casou-se, em 1925, com Alda Hithchings Magalhães, tornando-se sócio da firma G. Roubach & Cia, juntamente com Arnaldo Magalhães, seu sogro, e Gastão Roubach. A convite de interventor João Punaro Bley, em 1938 funda e dirige, juntamente com Mário Aristides Freire, o Banco de Crédito Agrícola (depois Banestes), tendo depois disso seu nome indicado juntamente com o de outros dois, para a sucessão na interventoria. Foi então escolhido por Getúlio Vargas como novo interventor, cargo em que permaneceu de 1943 a 1945. Em 1954 retomou seu trabalho no banco, chegando à presidência, sendo, em 1950, eleito  governador do estado. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)

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