Voltar às postagens

A um servidor público não identificado (Vitória, 14/03/1952)

Vitória, 14 de março de 1959.

Prezado Senhor:

Somente hoje me sobrou oportunidade para responder à carta de V. Excia., datada de 24 de janeiro último, na qual se revela decepcionado com a lei que exclui os aposentados do benefício-família criado pelo Instituto de Assistência e Previdência Jerônimo Monteiro.

Lamento sinceramente ter o distinto amigo sofrido o sentimento que manifesta. É destino, parece-me, de todas as leis e de todas as administrações merecer censuras e críticas ou despertar ressentimentos, muita vez justos, porque não podem, umas e outras, evidentemente, acudir a casos de caráter mais pessoal, nem atender a interesses coletivos por através de um prisma sentimental.

Entretanto, não me custa, em homenagem ao digno amigo, prestar-lhe informações sobre os motivos de ordem técnica que levaram o legislador a não acolher a família dos aposentados entre os beneficiados, nem eles, nem suas famílias.

Saliento primordialmente que os aposentados continuam a ter, na vigência da nova lei, tudo quanto lhes assegurava a Caixa de Beneficência Jerônimo Monteiro, não tendo sofrido, portanto, nenhum prejuízo, nem eles, nem suas famílias.

Quando a atual administração do Estado cogitou de melhorar a situação da família dos funcionários no caso do falecimento destes, não o quis fazer empiricamente, para que o Instituto em criação não fracassasse em suas finalidades. Recorreu a cálculos atuariais, de modo a que os riscos ficassem reduzidos ao mínimo e a fundação se pudesse manter. Ora, os aposentados, salvo em pequenas exceções, ou o são em virtude de invalidez, ou o são por limite de idade. Em ambas as hipóteses, os riscos de letalidade são, por assim dizer, imediatos. Como, pois, acarretar, para o Instituto e para o Estado, tão pesados prováveis encargos, sem que previamente e por largo tempo esses aposentados houvessem concorrido para o fundo financeiro da instituição? Por outro lado, como admitir os aposentados, sem exigir deles um elevado prêmio de seguro, agravando-lhes a economia?

O próprio Jerônimo Monteiro, a cuja administração, tão notável em sua época, o digno amigo empresta os maiores gabos, aos quais sinceramente me associo, ao fundar, em 1910, a Caixa que tem o seu nome perpetuado no novel Instituto, tomou, em relação aos funcionários maiores de 50 anos, medida semelhante à que a Lei 615 determinou em relação aos atuais aposentados. Lembro o Decreto 792, de 11 de janeiro de 1911. E assim o fez aquele grande administrador, levado pelos mesmos motivos de ordem técnica inspiradores da exclusão dos aposentados posta em prática na Lei 615.

Concordará certamente comigo o digno amigo em que, se era justa em 1911 a exclusão dos maiores de 50 anos, também será justa, agora, medida semelhante com referência aos aposentados.

Não foi sem pesar que me resignei a essa medida. Se obedecesse, como administrador, somente aos impulsos do coração, por certo a teria rejeitado. Mas cumpre-me velar pela economia do Instituto, para que não pereçam os seus objetivos. E só nesse sentido é que fizemos constar da letra da lei aqueles incisos que motivaram a sua carta, que agora respondo prazerosamente.

Ao ensejo, envio-lhe, com os cumprimentos, o meu mais

Cordial abraço.

[In Cartas selecionadas – Jones dos Santos Neves. Vitória: Cultural-ES, 1988.]

———
© 1952 Texto com direitos autorais em vigor. A utilização / divulgação sem prévia autorização dos detentores configura violação à lei de direitos autorais e desrespeito aos serviços de preparação para publicação.
———

Jones dos Santos Neves graduou-se em Farmácia no Rio de Janeiro e, de volta a Vitória, casou-se, em 1925, com Alda Hithchings Magalhães, tornando-se sócio da firma G. Roubach & Cia, juntamente com Arnaldo Magalhães, seu sogro, e Gastão Roubach. A convite de interventor João Punaro Bley, em 1938 funda e dirige, juntamente com Mário Aristides Freire, o Banco de Crédito Agrícola (depois Banestes), tendo depois disso seu nome indicado juntamente com o de outros dois, para a sucessão na interventoria. Foi então escolhido por Getúlio Vargas como novo interventor, cargo em que permaneceu de 1943 a 1945. Em 1954 retomou seu trabalho no banco, chegando à presidência, sendo, em 1950, eleito  governador do estado. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)

Deixe um Comentário