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Brasil (Descrição de vários arvoredos frutíferos do Brasil) e seus préstimos; Descrição da costa do Brasil e das capitanias do Espírito Santo, Pernambuco, Bahia, São Vicente, Porto Seguro e Ilhéus pelo padre Simão de Vasconcelos

Índios Tupiniquins.
Índios Tupiniquins.
Autor: Pe. Simão de Vasconcelos
Transcrição, comentários e atualização do texto: Maria Clara Medeiros Santos Neves





Apresentação

Nesse manuscrito do século XVII padre Simão de Vasconcelos faz uma pequena introdução de natureza histórica sobre a capitania do Espírito Santo para depois abordar o assunto principal, descrevendo algumas espécies botânicas aqui encontradas que, segundo ele, eram muito apreciadas e valorizadas pela medicina da época.

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Está esta capitania em altura de 20 graus e 1/3º; distante 120 léguas da Bahia, e de São Vicente outras tantas. Foi fundada no ano de 1551 por Vasco Fernandes Coutinho, fidalgo de igual valor e nobreza, dos mais ilustres, e antigos solares de Portugal. Concedeu-lhe o Senhor Rei D. João 3º 50 léguas [ilegível] começando donde acabasse a data de Pedro de Campos, donatário de Porto Seguro, correndo ao sul, pelos serviços que na Índia fizera. Na armada que preparou e aprontou à sua custa veio ao porto que hoje chamamos de Espírito Santo, e entrando da barra para dentro à mão esquerda, junto ao monte de Nossa Senhora, lançou-se a gente naquelas praias e nelas se começou a fundar a vila, que agora tem o nome de Vila Velha, com a invocação de Espírito Santo, que foi depois o de toda a capitania. Por motivo das apertadas guerras que tiveram estes novos povoadores com os índios da nação dos guaianás, e de tupinaquis,[ 1 ] que ficaram vencidos, alguns não persistiram naquela primeira situação, mas logo depois das vitórias alcançadas contra os índios inimigos, foi mudado o sítio para outro mais seguro, e forte, onde vemos [ilegível] com a invocação da Vitória, por respeito de uma que antes se alcançou considerável, pela numerosidade de bárbaros que acometeram.

Cabureíba (Myrocarpus frondosus).
Cabureíba (Myrocarpus frondosus).

Está esta vila em lugar igualmente defensável e cômodo para a vida humana: cercado de água, armado de penedia, horrível por natureza, habitável por arte: junto ao rio, perto da barra, senhor de pescarias, e mariscos sem número. Seus arredores são terra fértil, capaz de grandes canaviais, e engenhos; seus campos amenos, retalhados de rios e fontes; suas matas recendem, são delícias dos cheiros, bálsamos, copaíbas, almécegas, sassafrases; seus montes estão prenhes de minas de vária forte de pedrarias, de prata, e de ouro. São altíssimas as árvores do bálsamo, de troncos grossos, e estendidas ramas, que excedem muito às do célebre bálsamo da Palestina. Um gênero delas chamam os naturais cabureíba,[ 2 ] de cor cinzenta, folhas à maneira de mirto, e casca de grossura de um dedo. Esta casca, pois, golpeada no mês de fevereiro, ou março, em conjunção de Lua cheia, lança pelas feridas em vez de sangue, cópia de licor amarelo fragantíssimo, e preciosíssimo, a que chamamos bálsamo, em tanta quantidade, que corre o mundo todo, ou como sai da árvore, ou feito em obra de bolas, vasos, contas, e semelhantes peças cheirosas.

Sassafrás ( Ocotea odorifera).
Sassafrás ( Ocotea odorifera).

É admirável sua virtude medicinal: ele já supre uma botica de remédios humanos; resolve, digere, e conforta por intenção cálida, e seca. Duas gotas dele levadas em jejum pela boca, desfazem a asma, e cruezas do ventre e conforta as entranhas. Com ele mesmo esfregado o peito se desfazem as opilações frias; e esfregada a cabeça, e pescoço, com pano vermelho, corrobora o cérebro, preserva de apoplexia, e espasmo. Tem eficácia grande para sarar feridas e mordeduras de animais peçonhentos. Os próprios [brutos?] levados pelo instinto natural, quando estão feridos correm a esta árvore e mordendo-lhe a casca [ilegível] remédio ao seu mal. Em diversas partes do Brasil nascem estas árvores, como no Rio de Janeiro, São Vicente, e Pernambuco, porém nem em tão grande cópia nem de tão fino bálsamo, como nesta capitania.

Ao outro gênero chamam os naturais copaíba. É também [de] grandes árvores, também cinzentas, porém são maiores as folhas. Ferido o tronco até a medula, especialmente em conjunção de Lua cheia, recebem-se de licor grandes [ilegível] chamam-lhe – como à árvore – copaíba: e quando [palavras perdidas] o buraco por outro, ou mais dias; quando depois se [palavras perdidas], sai com a mesma liberalidade. O cheiro [palavras perdidas] é tão precioso, mas é igualmente medicinal que [palavras perdidas].

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NOTAS

[ 1 ] Tupiniquins.
[ 2 ] Cabreúva ou cabriúva.

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Simão de Vasconcelos nasceu em 1597, em Portugal, e veio para o Brasil em 1615, tornando-se jesuíta. Padre e professor de Humanidades, Teologia Escolástica e Moral, em 1643 assumiu a vicereitoria do Colégio da Bahia, cargo em que permaneceu por dois anos. Em 1646 toma posse como reitor do Colégio do Rio de Janeiro, reassumindo a mesma reitoria em 1670. Entre suas obras está a Vida do Venerável Padre José de AnchietaVida do Pe. João de Almeida da Companhia de Jesus, na província do Brasil (1658); Crônica da Companhia de Jesus do Estado do Brasil e do que obraram seus filhos nesta parte do novo mundo (1663); Sermão que pregou na Bahia em o primeiro de janeiro de 1659 (1663); Notícias curiosas e necessárias das coisas do Brasil (1668).

Maria Clara Medeiros Santos Neves, coordenadora do site ESTAÇÃO CAPIXABA, é museóloga formada pela Universidade do Rio de Janeiro e pós-graduada em Biblioteconomia pela UFMG, autora do projeto do Museu Vale e de diversas publicações. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)

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