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Capítulo I – Pasto Novo

Os irmãos Alves — Chico e Bernardo —, mais por iniciativa deste último, requereram, no início da década de 40, uma área de mata próximo a Linhares, que passaria a chamar-se Fazenda Pasto Novo.

Possuía apenas uma pequena área desmatada pela natureza, chamada de nativo pelos caboclos, bem no interior da densa Mata Atlântica. Os seus proprietários não pretendiam fazer nenhuma exploração agrícola mas sim utilizá-la, inicialmente, para caçadas de macuco.

Pasto Novo — o nome é conservado até hoje, nos mapas modernos, com a mesma localização — fica próximo da reserva biológica de Sooretama, entre Rio Bananal e Jaguaré, cortada pelo riacho Cupido.

Foi lá que, muito jovem, fiz minha primeira caçada de macuco.

Tio Bernardo confiou-me a um caboclo e disse-lhe que me levasse a um macuco que empoleirava perto do rancho. Chegando ao local ao escurecer, o caboclo me mostrou um bonito macuco em seu poleiro, um galho que atravessava por cima da picada. O bicho estava tranqüilo, considerando-se, naquele pouso, a salvo dos predadores. Então atirei e me apossei do famoso pássaro que, embora abatido de maneira muito covarde, foi meu primeiro motivo de orgulho como caçador.

Fiquei sabendo, posteriormente, com base em observações, que o macuco escolhe para poleiro pequenas abertas na mata — resultado de galhos partidos —, beira de aceiro, beira de estrada, picadas, enfim lugares que lhe possibilitem espaço para voar quando perseguido por bicho selvagem ou humano…

Muitos caçadores se embrenham no interior das matas à procura do macuco, deixando para trás, na beira da estrada ou do aceiro, o cobiçado pássaro. Pensam, equivocadamente, que esses locais de muito trânsito afugentariam o pássaro. Pura besteira…

Na mata do Pasto Novo, como era de esperar, havia muita onça. Quando chovia, a água apagava os rastros velhos, aparecendo então novos rastros, tão grandes que nosso punho fechado não bastava para cobri-los… Logicamente, isso intimidava bastante os caçadores, sobretudo os mais medrosos.

Cacei muitas vezes nessas e em outras matas, devidamente silencioso e camuflado dentro da choça, e nunca vi uma onça sequer. Elas têm vida noturna, como também suas presas — pacas, veados, etc. — e saem de preferência em noites escuras, sem a luz da lua.

João Copisque era o sitiante que tomava conta da propriedade. A mulher dele certa vez afirmou que viu, durante o dia, apavorada, uma onça próximo do barraco, sem ter sido porém molestada pela fera.

Nessa aberta deparei, certa vez, com um enorme touro baio, perdido naquela longínqua região. Por azar, ele partiu, resoluto, em minha direção e, não tendo onde me abrigar, fui obrigado a atirar nele, na cabeça. Era uma manhã de muita cerração e muita umidade, e o tiro levantou uma pequena nuvem d’água, que o fez recuar.

Com o falecimento do meu pai, propus comprar a parte do meu tio, mas ele não concordou. Fiquei sabendo, mais tarde, que a região fora parcialmente invadida.

[ALVES, Luiz Flores. Caçadas. Reprodução parcial do livro publicado em Vitória-ES, pelo Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo e Prefeitura Municipal de Vitória em 1999. Reprodução autorizada pelo autor.]

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Luiz Flores Alves nasceu em Vitória, em 1920, e mudou-se no mesmo ano para Cachoeiro de Itapemirim-ES. Trabalhou na CVRD de 1942 a 1946 como administrador na construção de vários trechos da estrada de ferro. No Rio de Janeiro trabalhou em várias obras públicas e formou-se em Economia. Aposentou-se em 1985 como diretor do Centro Jurídico e Econômico da Universidade Federal do Espírito Santo. Faleceu em Guarapari, ES, no ano de 2003.

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