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Discurso proferido pelo senhor Governador Jones dos Santos Neves, na solenidade de instalação da Universidade do Espírito Santo, a 26 de maio de 1954.

Compreendereis certamente, e em vossa grande generosidade e tolerância haveis de me relevar, sem dúvida, a profunda emoção com que me levanto agora para declarar solenemente instalada a Universidade do Espírito Santo.

É este, em verdade, um momento estelar da nossa história. Temos o privilégio de vivê-lo, e, mais do que isto, reservou-nos a Providência Divina, em seus secretos e invioláveis desígnios, a nobre e excelsa missão de partilharmos, como artífice, deste capítulo excepcional dos nossos destinos culturais.

Como diria o Apóstolo: infirma mundi elegit Deus ut confundat fortia — Deus escolhe as pequenas coisas para confundir as grandes. É a explicação que encontro, na humildade do meu espírito, para justificar a minha obscura presença na madrugada de luz que representa, em nossa história, a fundação deste Instituto.

Na realidade, porém, se pesquisarmos mais fundo as circunstâncias fortuitas que permitiram e facilitaram a cristalização dessa ideia, quase utópica, há três anos passados, constataremos a evidência de que, pelo seu extraordinário surto de progresso econômico, já soara, para o Espírito Santo, o instante propício ao soerguimento das colunas eternas de seu futuro Panteon Cultural.

Somos um Estado pequeno que se agiganta no conceito da Federação. E deixamos definitivamente para trás os dias de vacilação e incertezas, de esmorecimentos e desânimos que nos entibiavam os passos. Resolvemos ser grande e estamos levando de vencida todos os obstáculos que se contraponham às nossas vontades. Precisávamos crescer, e vamos dilatando as nossas fronteiras internas, vencendo a selva e conquistando novos espaços sociais nos vazios geográficos do norte. Tínhamos necessidade de ampliar os horizontes urbanos da nossa Capital, e fizemos recuar o oceano, soterrando os marnéis e criando novas e extensas áreas de construção. Pretendíamos ampliar o nosso aparelhamento portuário e já somos hoje o primeiro porto do Brasil em tonelagem exportada. Vivíamos em crise de energia, e subjugamos a natureza construindo Rio Bonito, a grande Central Elétrica que comandará a plena valorização econômica do Estado. Quase não possuíamos escolas superiores, e. hoje temos uma Universidade. Estamos assim presentes ao encontro que tínhamos marcado com o destino para a conquista do nosso apogeu econômico. E aqui, como em toda parte do mundo, nos dias que correm, é a expansão econômica que dirige e norteia os ressurgimentos culturais.

Já vão longe os tempos em que as Universidades da idade média surgiam à sombra das catedrais, como represália ao jugo tirânico das aristocracias.

Hoje, no conceito lapidar de Anísio Teixeira, elas se abrem para “socializar a cultura, socializando os meios de adquiri-la”.

“A Universidade é, pois, na sociedade moderna, uma das instituições características e indispensáveis, sem a qual não chega a existir um povo.” “Trata-se de manter uma atmosfera de saber pelo saber, para se preparar o homem que o serve e o desenvolve. Trata-se de conservar o saber vivo e não morto, nos livros ou no empirismo das práticas não intelectualizadas. Trata-se de difundir a cultura humana, mas de fazê-lo com inspiração, enriquecendo e vitalizando o saber do passado com a sedução, a atração e o ímpeto do presente.”

É, enfim, a “Educação para a Democracia”. Essa a finalidade excelsa que vaticinamos para a nossa Universidade. Tal deve ser o seu lema e o seu objetivo. Pelo seu pórtico monumental, que hoje estamos a erigir, desfilarão gerações e gerações de moços, sôfregos de saber e de cultura, formando falanges, sucessivas, irmanadas pelo espírito universitário e pelas lições de liberdade e democracia, que lhes permitam cumprir, com dignidade e civismo, a sua nobre e eterna missão de assegurar e proteger a sagrada perpetuidade da Pátria.

Ás efusões de justificada alegria com que devemos todos nos congratular pela magnitude da solenidade, quisestes ainda acrescer outras emoções, cumulando-me de imerecidas homenagens que valem somente para avivar os brasões da vossa generosidade. Guardarei indelével na recordação, por todos os anos de minha existência, o carinho desses estímulos e a espontaneidade dos vossos generosos conceitos e gestos, que constituirão sempre os mais nobres pergaminhos da minha vida pública.

Dentre essas homenagens, devo destacar, no entanto, pela nobreza que encerra e pela emoção com que a recebo, o precioso depoimento da vibrante juventude universitária do nosso Estado.

Não sei, não posso saber, como poderia externar-lhe o meu reconhecimento senão repetindo o que sempre afirmei: a criação da Universidade do Espírito Santo é, sobretudo, um ato de fé na mocidade de minha terra.

Ou pedindo emprestado, ao gênio da raça, as palavras que têm sido um catecismo em minha vida pública: “as águias, para estenderem seus longos vôos, procuram os píncaros, donde descortinam, entre a terra e o céu, o oceano transparente dos espaços. Assim, parece que as grandes ideias, quando tentam a conquista do mundo, procuram a alma da mocidade, para dali desferirem, entre o passado e o futuro, o voo de sua dominação. Aos problemas que nos assaltam, oponhamos a alma da mocidade, para quem o direito não se fez do aço das espadas, mas do ouro da justiça, para quem a Pátria, grande, feliz e próspera, é a suprema aspiração de todos.”

Meus senhores e minhas senhoras:

Está instalada a Universidade do Espírito Santo. Ela pertence aos moços e sob a sua inspiração foi criada. Seu destino será, assim a Glória e a Eternidade da Pátria.

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Jones dos Santos Neves graduou-se em Farmácia no Rio de Janeiro e, de volta a Vitória, casou-se, em 1925, com Alda Hithchings Magalhães, tornando-se sócio da firma G. Roubach & Cia, juntamente com Arnaldo Magalhães, seu sogro, e Gastão Roubach. A convite de interventor João Punaro Bley, em 1938 funda e dirige, juntamente com Mário Aristides Freire, o Banco de Crédito Agrícola (depois Banestes), tendo depois disso seu nome indicado juntamente com o de outros dois, para a sucessão na interventoria. Foi então escolhido por Getúlio Vargas como novo interventor, cargo em que permaneceu de 1943 a 1945. Em 1954 retomou seu trabalho no banco, chegando à presidência, sendo, em 1950, eleito  governador do estado. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)

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