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Eu sou pobre, pobre, pobre…

Eu sou pobre, pobre, pobre,
De mavé, mavé dici.
Eu sou pobre, pobre, pobre,
De mavé dici.

Eu sou rica, rica, rica,
De mavé, mavé dici.
Eu sou rica, rica, rica,
De mavé dici.

O que é que vós quereis?
De mavé, mavé dici.
O que é que vós quereis?
De mavé dici.

Quero uma de vossas filhas,
De mavé, mavé dici.
Quero uma de vossas filhas,
De mavé dici.

Qual é delas que vós quereis?
De mavé, mavé dici.
Qual é delas que vós quereis?
De mavé dici.

Quero a menina fulana,
De mavé, mavé dici.
Quero a menina fulana,
De mavé dici.

Que ofício dar a ela?
De mavé, mavé dici.
Que ofício dar a ela?
De mavé dici.

Dou o ofício de costureira,
De mavé, mavé dici.
Dou o ofício de costureira,
De mavé dici.

Este ofício não lhe agrada,
De mavé, mavé dici.
Este ofício não lhe agrada,
De mavé dici.

Dou o ofício de professora,
De mavé, mavé dici.
Dou o ofício de professora,
De mavé dici.

Este ofício lhe agrada,
De mavé, mavé dici.
Este ofício lhe agrada,
De mavé dici.

É um dos mais queridos brinquedos de “fileira” que se cantam no Espírito Santo. Dela há variantes diversas, alterando apenas o estribilho correto “Je m’en vais d’ici” (Vou-me daqui) — que ninguém canta — pelas formas adulteradas: “Je marré dici”, “De mavé dici”, “De marré dici”, “De mazé dici” e “Je mouvé dici”.

Segundo Cecília Meireles, (“Infância e folclore”, A Manhã, 02/4/1942) o tema desta canção de roda “vem a ser uma reminiscência das antigas cerimônias da “escolha de noiva”.

Mas, hoje em dia, este brinquedo tem outro sentido. Trata-se de adoção de meninos e meninas “pobres”, com a promessa, por parte da “mãe” rica, mas sem filhos, de lhes dar ofícios condignos.

A cantiga é muito divulgada no Brasil. Além das variantes citadas por Cecília Meireles, conhecemos a que se vê em Os nossos briqnuedos, p. 99, em O Brasil cantando, n. 135, no Guia prático, n. 98 e na História da música brasileira, de Renato Almeida, p. 108.

As músicas fixadas quer por Alexina de Magalhães Pinto, quer por frei Sinzig (versões mineiras), divergem da que se canta aqui no Espírito Santo. São monótonas e, a nosso ver, menos belas que a variante capixaba.

A versão fluminense ambientada por Villa-Lobos, bem como a de Alagoas citada na História da música brasileira são idênticas à melodia que aqui fixamos.

Modo de brincar: Forma-se uma grande fileira de crianças, todas de mãos dadas, tendo ao centro a “mãe” pobre. Distante, voltada para elas, a “mãe” rica, mas em filhos. Começa o brinquedo e a fila numerosa, aproximando-se da mãe sozinha, entoa o “Eu sou pobre, pobre, pobre”, e depois recua. Avança, então, a “mãe” sem filhos, cantando: “Eu sou rica, rica, rica”. E o folguedo prossegue no diálogo da cantiga, com avanços e recuos de cada parte, passando a criança, quando o ofício lhe agrada”, para a companhia da “mãe” rica, até que a fileira pobre esteja reduzida à “mãe” ou diretora do jogo.

Forma-se, então, a grande roda, e as crianças, de mãos dadas, giram rápido cantando repetidamente, tal como ocorre na versão de Cecília Meireles (op. cit.):

Fazeremos a festa juntos,
De mavé, mavé dici.
Fazeremos a festa juntos,
De mavé dici.

Em rodas de crianças maiores, o “fazeremos” se corrige em “vamos fazer”.

Em Manguinhos, em vez desses versos, canta-se repetidamente:

Eu de rica, fiquei pobre,
De mavé, mavé dici.
Eu de rica fiquei pobre,
De mavé dici.

E depois, da mesma forma:

Eu de pobre fiquei rica,
De mavé, mavé dici.
Eu de pobre fiquei rica,
De mavé dici.

[SANTOS NEVES, Guilherme (pesquisa e texto), COSTA, João Ribas da (notação musical). Cantigas de roda. Vitória:Vida Capichaba, 1948 e 1950. (v. 1 e 2).]

Guilherme Santos Neves foi pesquisador do folclore capixaba com vários livros e artigos publicados. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)

João Ribas da Costa foi professor no interior do Estado do Espírito Santo.

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