Agrada ao poeta o que é breve e bom.
O silenciar-se, quando
não o delonga a morte.
A paz de quem dorme, o sol
que, mal entardece, prenuncia
a alva.
O que perdura enquanto aprazível.
O riso comedido,
a boa sombra, o sonho
apenas percebido.
O olhar, cujo fulgor
de amor
é breve chama
de quem pra quem se ama.
Encontro desde a aurora
em meu caminho:
o indiscreto; e, assim, melhor é
ir-me sozinho.
O ingrato, em quem outrora
botei fé.
O insolente, cuja palavra desafia
e corta.
O velhaco a me espreitar à porta.
O invejoso; a esse, todo dia
pago-lhe bom preço
por ser seu avesso.
E o egoísta, a me fartar seu ego,
enquanto o meu comigo eu já carrego.
Um príncipe
se vê.
Seu principado
é o legado
em que
ele crê.
Ser-se
reinol
sem mais
vassalo
que a chuva,
o sol,
e o seu
cavalo.
Construo
em ti,
amada,
o fruto
do que,
dulcíssimo,
plantamos.
E em tua
fronte
teço
e teço
a noite.
Nela eu
adormeço.
Tardes e mais tardes
a prenunciavas:
tua ausência, feita de
esperas.
Longe, consumido,
foi-se o tempo ido.
Nele perseveras.
Mágico momento,
esse em que restavas
viva mais que
morta.
Longe, o tempo ido
foi-se, consumido
no ar que o transporta.
Apressa-te, mas
lentamente,
como
ao sazonar-se, o fruto,
antes semente.
Cuida de
lembrar:
o perto, às vezes, se
demora:
espera a tua hora
quando e onde
no devagar
a pressa, aí, se
esconde.
Buscar o essencial.
No que dizes. No que, a outrem,
não se refuga ou nega. No que inútil
é sabê-lo, e assim o desaprendas.
Onde se pisa: naquela ou nesta senda.
No que à mesa partilhas, ela feita.
No desprezá-la, impulsivo,
à morte enquanto vivo.
No que velado está, ou expõe-se à vista.
No sim e no não. No côncavo
da mão
que, ao dar-se, apenas se deleita.
No que tem sabor. E qual. E quando.
No que se foi ou não, se ainda o estás buscando.
Antes que cante o galo
e tartamude o mudo,
acorda o teu cavalo.
Eis tudo.
Faz que siga
a trilha mais antiga, aquela
a amenizar-lhe a sela.
Planta, aí,
a cana e o feno
do frenesi mais doce e mais ameno.
Teça-
-lhe a estrada, lhe agradeça
a cavalgada.
De nada.
[In O livro das coisas, 1992.]
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Roberto [Leite Ribeiro] Almada, poeta, nasceu em 22 de junho de 1935, em Juiz de Fora, MG. Morou no Rio de Janeiro, onde trabalhou como roteirista de fotonovelas, adaptador de teleteatro e redator. Casou-se em 1960 com Vilma Paraíso Ferreira, em Guaçuí, ES, onde atuou como professor. Alguns anos mais tarde transferiu-se para Vitória. Mudou-se para São Paulo, mas veio a falecer em Vitória a 22 de março de 1994. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)