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Nota do transcritor

O objetivo maior deste projeto foi a reprodução do acervo integral do poeta Narciso Araújo para divulgação online. Para cumprir da melhor maneira esse objetivo, porém, entendeu-se que convinha realizar não só a digitalização e tratamento de imagens dos documentos em si, mas também a transcrição do texto de todos os poemas (bem como de outros textos relevantes para o estudo da vida e obra do poeta). Dessa forma, o leitor teria a seu dispor, como alternativa de leitura, a transcrição integral da obra poética de Narciso Araújo preservada no acervo (obra a que se deu o título de Todos os poemas!), sem que lhe fosse imposta a tarefa, no caso específico dos textos manuscritos, de decifrar a escrita do autor, nem sempre legível.

Logo, porém, tomou-se a decisão, extrapolando-se o previsto no projeto submetido à Secult (no espírito da velha norma de que quod abundat non nocet), de produzir não uma única versão do material transcrito, mas duas versões diferentes: uma delas na ortografia original dos documentos (ou, no plural, nas ortografias originais, que são as do final do século XIX e do início do século XX), e outra na ortografia atual.

A primeira se destina mais diretamente aos leitores acadêmicos ou aos que tenham curiosidade e prazer no trato com textos antigos. Já a segunda atende os interessados no texto poético per si, sendo expressamente adequada para uso em sala de aula, sobretudo do ensino fundamental e médio.

Paralelamente, decidiu-se que a versão transcrita na grafia atual contivesse apenas o texto límpido dos poemas, da forma como seria editado, se fosse o caso, em livro destinado ao grande público. Quanto à versão transcrita na grafia original, esta adiciona ao texto dos poemas toda a carga de informações constantes nos respectivos manuscritos: atende assim a objetivos críticos nas linhas da ecdótica ou da crítica genética, pois aí estão as notas originais do autor (data e local de produção, eventuais registros e informações sobre poemas, frases soltas de cunho pessoal etc.) bem como as variantes textuais (títulos, versos, estrofes e algumas versões alternativas de um poema inteiro), organizadas como notas pelo transcritor. Com isso pretende-se assistir até mesmo o leitor acadêmico, provendo-lhe um guia que lhe adiante a tarefa de, por exemplo, decifrar rascunhos de poemas, corrigindo então possíveis equívocos de leitura do editor.

Convém enfatizar aqui que o registro de variantes só foi feito para os poemas manuscritos – não se estende, portanto, às versões impressas em jornais ou incluídas no livro Poesias, umas e outras facilmente legíveis.

Essa política de texto se traduz numa diferença básica entre as versões original e atual: a primeira privilegia a versão final manuscrita de cada poema, enquanto a segunda privilegia a última versão impressa. Neste caso em particular, essa última versão pode ser a de um dos jornais ou recortes de jornal disponíveis no acervo ou ainda a do exemplar do livro Poesias, que, diga-se de passagem, pertenceu ao poeta: aí, a última versão de um poema impresso terá incorporado as correções feitas pelo poeta no próprio volume ou na errata que elaborou pós-edição.

O inventário traz em detalhe o histórico das fontes de cada poema. Essas fontes podem ser, como vimos, manuscritas ou impressas:

a) Fontes manuscritas: o Caderno de Direito do poeta, no qual alguns poemas se intercalam a anotações de aula e até a detalhes como lista de livros seus próprios e rol de roupa; o Primeiro Caderno de Poesia; o Segundo Caderno de Poesia; e as folhas avulsas, entre as quais as cópias xerográficas dos 29 poemas do ciclo “Maria”;
b) Fontes impressas: jornais do Rio de Janeiro (Rua do Ouvidor), de Itapemirim (O Caboclo e O Eco) e de Cachoeiro (O Cachoeirano), e recortes de jornal, muitos deles sem indicação de fonte nem data.

Repare-se que, se o poeta muitas vezes indica em nota manuscrita a publicação de um poema em jornais, dando título do periódico e data de edição, isso não significa que essa fonte tenha sido preservada e integre o acervo. Na maioria dos casos, não foi e não integra e, embora a informação conste do inventário, não lhe afeta a contagem de páginas na coluna respectiva.

Respeitou-se, o mais possível, a linguagem textual do poeta. Foram mantidos, por exemplo, suas aspas, travessões, iniciais maiúsculas, erros veniais de gramática, disposição dos versos na página e coisas assim. As interferências julgadas necessárias pelo transcritor estão entre colchetes; no caso de poemas sem título, promoveu-se a título o primeiro verso, também aí entre colchetes.

A datação dos poemas manuscritos representou uma tarefa à parte. No início de sua atividade como poeta Narciso Araújo teve a preocupação de datar os poemas (dia, mês e ano e, às vezes, a hora em que foram escritos) e até de registrar o endereço em que residia na ocasião, quer no Rio de Janeiro (mais de um), quer em Itapemirim (o Brejo dos Patos). Grande parte dos poemas manuscritos avulsos traz também data, mas restrita às vezes só a dia e mês, sem o ano. O poeta numerou em sequência cronológica boa parte desses manuscritos, o que permitiu estabelecer a data de muitos deles. Quanto aos manuscritos não numerados, porém, foi preciso às vezes deduzir-lhes a data por meio de informações e associações de todo tipo, inclusive o tipo de papel usado para os poemas e a caligrafia do poeta, mutável ao longo dos anos. De qualquer modo, fica ainda por fazer-se com mais acuidade e segurança a tarefa definitiva de datação dos poemas de Narciso Araújo.

Os demais textos manuscritos (ou datilografados) transcritos, disponíveis em pequeno número no acervo, compreendem apontamentos históricos, notas autobiográficas e correspondência ativa e passiva. Transcreveram-se também alguns textos impressos, sobretudo quando assim o exigia o estado precário do documento ou ainda quando se tratasse de textos de Narciso em prosa.

Reinaldo Santos Neves
Transcritor 

Reinaldo Santos Neves é escritor com vários livros publicados e foi responsável pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas da Literatura do Espírito Santo, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal do Espírito Santo. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)

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