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O morro do Moreno na história do Espírito Santo

Assim que chegou à sua capitania, Vasco Fernandes Coutinho estabeleceu o colono João Moreno naquele que seria o primeiro posto de observação da província e que, mais tarde, tomou seu nome. João Moreno foi citado no “Tratado Descritivo do Brasil”, escrito por Gabriel Soares de Souza, no ano de 1587. João Moreno teve como função observar a aproximação de navios corsários comuns na época e deveria ocupar-se também da plantação das sementes que trouxeram de Portugal por ser o local de terra fértil e próximo de um riacho de água doce. Esse pequeno riacho ainda existe, está drenado por tubulações sob aterro e deságua na pequena praia que leva o seu nome, praia do Ribeiro. Pode ser visto junto ao portão secundário da propriedade da família Helal.

Em “História do Estado do Espírito Santo”, José Teixeira de Oliveira (p. 109), diz que o donatário estabeleceu sua Fazenda da Costa no lado leste do morro do Moreno e ali morou até o seu falecimento em 1561 e que ali também residiu seu filho herdeiro e sucessor, Vasco Fernandes Coutinho (filho).

Ao atribuir ao Morro do Moreno a importante missão de ser o grande vigilante do nosso litoral podemos dizer que essa missão se reacendeu mais do que nunca, a partir do descobrimento do ouro na região das minas, a partir de 1693. Foi quando Portugal determinou por Regimento que a capitania do Espírito Santo impedisse que súditos seus passassem na direção do sertão e que nenhuma embarcação subisse rio acima, principalmente pelo rio Doce. Eram as primeiras medidas que tinham como objetivo impedir o contrabando de ouro que vinha das terras do atual estado de Minas Gerais.

Em 1929 a área ocupada pela fazenda da Costa situada entre a praia do Ribeiro, a ponta do Tagano, a praia de Santa Luzia, a pedra do Farol, o contraforte do Chavão e a pedra da Sereia e que pertenceu aos primeiros capitães, foi loteada com o nome Vila Maria Grinalda, pela Companhia Brasileira de Engenharia Comércio e Finanças.

Nos primeiros decênios do século XX, em razão do crescente comércio pelo porto da capital, foi implantado no cume do morro do Moreno o sistema semafórico de auxílio à navegação entre a boca da barra e o porto. Sobre isso colhemos em 1995, de João Barcelos,[ 1 ] filho de um dos últimos sinaleiros residentes em Vila Velha o seguinte depoimento:

Ambos, o morro do Moreno em Vila Velha e o maciço do Péla Macaco ou Cais de Minério (ao qual deram o nome de Atalaia), localizado no porto, foram dotados de mastro encimado por uma cruzeta cujas hastes recebiam bandeiras de cores diferentes. Por exemplo, a haste da esquerda voltada para o norte, recebia bandeira vermelha indicando a aproximação de navio no horizonte norte. A haste da direita, voltada para o sul, recebia bandeira azul indicando a vinda de navio procedente do sul e a haste superior de bandeira branca informava navio vindo do alto mar, ou do leste. O posto de observação do Péla Macaco (de onde se pode ver o Moreno a olho nu), repetia o mesmo sinal do Moreno, como uma estação repetidora. A cada sinal dado pelo Moreno representava haver o mínimo de uma hora em viagem de aproximação. Esses sinais terminavam em terra, na Capitania do Porto (órgão da Marinha) e nos trapiches das empresas de navegação que ultimavam os preparativos de embarque e desembarque por meio de alvarengas ou barcaças conduzidas por pequenas lanchas até os navios porque o porto de Vitória ainda não tinha berço de atracação.

Nos postos de observação havia uma cabana para abrigo do sinaleiro, cama de campanha e pequeno fogareiro. O posto do Moreno contava também com luneta de longo alcance, necessária na identificação das embarcações, bandeiras e outras informações úteis como o prosseguimento de viagem sem escala no porto de Vitória e usada também nos dias de mau tempo ou de visibilidade ruim. Só mais tarde pôde a autoridade falar diretamente por telefone com o sinaleiro do Moreno, como ainda com o posto da praticagem instalado na ilha da Baleia. No final da década de 30, este serviço semafórico deixou de existir, quando foi substituído por serviço telegráfico anunciando a nova tecnologia.

Ao cabo desta série de informações podemos dizer que o Moreno consolidou seu importante vínculo com a nossa história desde que foi escolhido pelo primeiro donatário como posto estratégico de observação do grande atalaia do litoral da Província do Espírito Santo.

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NOTAS

[ 1 ] João Barcelos, falecido no ano de 1998, era filho de Clementino Barcelos e dona Neném. Tinha Marina como irmã e a família morou na casa nº. 370 da rua Antônio Athayde, esquina com a Dom Jorge de Menezes. João exerceu com raro brilho a função de vereador na Câmara Municipal de Vila Velha, sua terra natal.

[SANTOS, Jair. Falando de Vila Velha. Vila Velha, 2002. Reprodução autorizada pelo autor.]

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Jair Santos é arquiteto e professor aposentado, natural de Alegre, ES, autor dos livros Vila Velha, onde começou o Estado do Espírito Santo e A igrejinha do Rosário.

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