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Poemas do livro Verdes versos

Não interrompam o cotidiano das serpentes
elas não buscam no homem seu veneno.


Por que as mariposas buscam insones?



Já os olhos dos homens seguem calados.
Perdidos de tantas vidas,
em seu longo jejum de atitudes
imersos em suas existências omissas.
Parasitas de sóis e estrelas
vidro fosco entre o luar e a razão.

A indiferença a essa luz que os perpassa
prenuncia o ser cego,
inclinado a parecer correto,
desterrado,
que se deixou na terra
a invejar os colibris.

Por que as mariposas buscam insones
o brilho no olhar da criança?

Morte às mariposas!!!?
Morte às crianças!???
Roga o olhar do homem em lágrimas,
o fim da poesia.


Sonolento



Quisera eu poder contar-te tudo, lúdico luar…
É que pálpebras me pesam de mais um dia…
Mas bem sei que, entre amantes, basta um sutil entre olhar,
para retirar dos guardados a palavra fugidia.

Mesmo assim, me esquivo dos teus olhos, cândida lua…
É que as verdades fogem mais fácil de um olhar cansado…
Sei, entretanto, que é inútil querer poupar-te do  que
[se insinua.
Em cada gesto tenso de meus dedos crispados.

Queria deitar-me em teu colo, luar idílico.
Apagar de minha mente esses pensamentos nômades;
e num ressonar de anjo te dizer de meu medo.

Só que a bruta vida que me faz ridículo,
fez-me preso a esse chão de homens distantes.
Parto… outra vez sem ti… para o sono…
[com meus segredos…


Tela



A vagina
ferida
de Frida.

As raízes
expostas
da vida.

Os soluços
perdidos
no escuro.

O fedor
do mijo
no muro.

As costas
viradas
para o futuro.

O mergulho
no mijo
no escuro.

O fedor
das raízes
da vida.

As vaginas
viradas
para o futuro.

Os soluços
expostos
de Frida.

(que chora)


Ideal

Para Vicente Nolasco

Abriu portas no labirinto dos séculos
e chegou ao ponto de partida.
Tinha dado a volta ao mundo
brincando de cabra-cega.
Adiante, somente a porta verde
emperrada pela ferrugem dos livros.
Usou do rastro da lesma
para azeitar a fechadura.
Lambeu os dedos até ficarem verdes
e persignou-se pela última vez.
Desarmou o trinco com uma cusparada certeira,
e foi sentar-se sobre o relógio de sol
para enganar o tempo.

Agora, era só esperar as borboletas…


Poema à morte da ingazeira

Morre de pé o verde,
até que a inexorável gravidade
trace seu rumo definitivo:
partir para o esquecimento.

A realidade de cada um

Desconheço a ordenação dos anjos,
mas sei das cores nas fachadas das casas.

Na foto antiga, as casas já receberam
O insofismável tom trazido pela areia do tempo.
Naqueles olhos ausentes,
que cruzaram desapercebidas
a falsa eternização do momento,
surpreendo o olhar humano.

Desconheço a verdade dos santos,
mas tenho aprendido sobre a mutilação do desejo.


Hóstia verde

Vó Bela!
O homem é assim:
cultiva a ausência do verde,
e quando este finalmente falta,
vende o que resta aos idólatras.

Benditos os iconoclastas
derrubadores do ídolo verde!

Vó Bela!
Será que chegará o dia
em que tomaremos em nossas bocas
uma folha verde como hóstia?


Sem fichas



A vida não é um jogo de baralho.
Não poderei simplesmente dizer “passo”.
Não me chegará às mãos
meu atestado de óbito.


Beijo



Quero comer a tua boca,
para misturar nossas palavras.

Quem sabe assim,
com as frases embaralhadas,
voltemos a criar caminhos.


Terroir



Iluminou-se o estilo:
rascante.
Espinha de peixe.
Monjolo a pilar a palavra
até que finde a água.

Jorge Elias Neto (1964) é capixaba, cardiologista e poeta residente em Vitória – ES. Tem vários livros publicados é colaborador em vários blogs e revistas literárias.
(Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)

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