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S.L.B., engenheiro aposentado

Bairro onde mora: Praia do Canto
Profissão: Engenheiro aposentado
Naturalidade: Vitória – ES
Idade: 55 anos
Tempo de residência em Vitória: 55 anos
Estado civil: Casado
Número de filhos: –



Você gosta de viver, morar e trabalhar em Vitória?

– Não. A cidade fere a minha mente e esmaga a minha sensibilidade. Vitória já não me inspira desilusão, mas um grande temor. A falta de respeito e de educação de seus habitantes aumenta a cada dia. Frivolidade e alienação podem ser observadas nos fatos mais simples do cotidiano. Um número considerável da população acredita na falácia do falso espetáculo da qualidade de vida da cidade, o que decididamente não é verdade. Há uma miopia coletiva, esconde-se atrás de uma fachada pérfida que não permite que se veja que uma cidade carente de sistemas básicos de atendimento à população jamais terá tal atributo: o serviço de saúde é cruel, o trânsito é hediondo, o transporte coletivo é horroroso, a violência urbana causa uma angústia sem precedentes, as ruas são inseguras e infestadas de flanelinhas que extorquem e ameaçam de maneira vergonhosa diante de uma polícia negligente e dissimulada que compactua de forma subserviente com a situação. Apesar de ter desistido da cidade, espero não perder jamais o meu poder de indignação. Há os que perderam e eu os compreendo, o hábito é um grande anestésico.



O que lhe agrada particularmente em Vitória?

– As distâncias, que são relativamente curtas.



Gosta mais do dia ou da noite em Vitória?

– Estando em casa, protegido, não faço distinção.

Como é a sua relação social com a cidade? É fácil relacionar-se com as pessoas aqui? É fácil fazer amizade e namorar em Vitória? É fácil manter contato com familiares e amigos?

– A cidade é boa devido à minha família e aos meus amigos. O relacionamento com as pessoas já foi mais fácil, em uma época em que a cidade era menor e “todos se conheciam”. Mas a população aumentou, Vitória cresceu e isso já não é tão simples, o que é compreensível.

Como vê a paisagem de Vitória? O que mais lhe agrada nela?

– O mar, vista comum a todas as cidades litorâneas. O mar torna a cidade bonita. Gosto de ver os navios na baía, o que é muito pitoresco.

Encontra amigos e conhecidos com frequência nas ruas, lojas, etc. de Vitória? Participa de grupos ou comunidades? Participa de tradições e festas populares?

– Não participo de festas. Encontro regularmente com meus amigos de um grupo literário que existe há mais de vinte anos, formado em uma livraria da cidade.



Como vê a cidade em relação aos idosos e às crianças?

– A velhice é pobre. Em países desenvolvidos as pessoas ficam ricas antes de envelhecerem. Para envelhecer com dignidade o idoso precisa de políticas públicas de saúde voltadas para a prevenção, a promoção e a reabilitação da saúde. Aqui existem programas de atendimento ao idoso, mas eu não sei ao certo quais são. Os caixas de instituições bancárias para atendimento preferencial aos idosos e a isenção de tarifa no transporte coletivo até que funcionam, mas é muito pouco. Para grande parte da população os idosos e os deficientes físicos são invisíveis. Sinceramente, são risíveis as placas indicativas de vagas em estacionamentos exclusivos para veículos de idosos e deficientes físicos – a exemplo de outras leis de trânsito elas também não são respeitadas. O vitoriense faz absoluta questão de não cumprir as leis, de não obedecer às regras.



Como vê a questão da saúde em Vitória?

– Lastimável, um faz de conta.



Como vê a questão da educação em Vitória?

– Mentirosa, também um faz de conta. Cabe aqui um antigo clichê, “as escolas fingem que ensinam e os alunos fingem que aprendem”. Mas há também ótimos estabelecimentos de ensino particulares. A educação em todos os sentidos, os valores éticos e morais, a formação de cidadania deixam muito a desejar. Parafraseando Millôr Fernandes, um número considerável da população da capital não tem a menor noção de cidadania, há quem considere cidadão apenas uma cidade grande.



E a questão da segurança?

– Lastimável com tendências a ficar pior, não são tomadas providências preventivas. Sorte é tudo de que precisamos. A falta de tranquilidade, a constante sensação de ameaça, o medo e o sentimento de apreensão provocam em minha memória lembranças e saudades de uma cidade que já não existe.



O que Vitória oferece em termos de lazer? E quais são as suas opções pessoais de lazer?

– O lazer da cidade está basicamente concentrado em três pontos, praia (?), bar e shopping. Gosto de caminhar pela orla, nas praças dos Namorados e dos Desejos, a paisagem é bonita e agradável, considero isto um grande privilégio, um espaço que a cidade tem de mais bonito. Como opção pessoal de lazer eu tenho a minha casa, com meus livros, discos e filmes.

Como está a questão do transporte coletivo e do trânsito em Vitória?

– O trânsito está difícil, confuso e desordenado, e sem dúvida ficará pior. A falta de educação e de respeito – sentimento que leva alguém a tratar outrem com atenção, estima e consideração – a irresponsabilidade da grande maioria dos motoristas, inconsequentes, insensíveis e emocionalmente desequilibrados, torna a situação ainda mais inconveniente e quase insustentável. O sistema de trânsito reflete a crise social, de intolerância, de desrespeito geral por tudo e por todos. Um transporte coletivo eficiente minimizaria consideravelmente a questão, foge à minha compreensão por que tal providência ainda não foi analisada com seriedade.



E as oportunidades de trabalho?

– Li recentemente uma pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas, de que Vitória está entre as melhores capitais para se trabalhar. Creio que seja verdade.



Como está a poluição sonora em Vitória?

– Esta questão é diretamente proporcional à falta de educação e de respeito da maioria da população da cidade. Cito como exemplo o caso dos bares em áreas residenciais. Parte dos frequentadores destes lugares é desorientada e não tem o menor respeito por nada e por ninguém. Não acatam, em nenhuma circunstância, uma regra básica, a que aprendemos ainda no berço, o princípio de alcance moral “o nosso direito termina onde começa o do outro”. Para esta gente tal frase evoca tempos remotos. Não se importam se na vizinhança há lares com crianças, idosos ou enfermos. O que querem é diversão a qualquer custo. São os chamados idiotas felizes. De maneira desrespeitosa e vil perturbam o silêncio convencidos de que têm o privilégio de viverem em uma cidade com ótima qualidade de vida.



Outros pontos que queira acrescentar.

– A cidade preserva mal (ou quase não preserva) a sua memória e o seu patrimônio histórico. A restauração do centro da cidade, que poderia tornar-se um lugar singelo e agradável, é um bom exemplo. É lamentável ver no que se transformou o centro de Vitória, uma decadência, um perfeito exemplo da mais degradada feira de rua. Está na hora de eu começar a achar que aquela paisagem é irrecuperável, que a batalha está irremediavelmente perdida.

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