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Suíte gargalhadas

Foto: Gilson Soares, 2014.
Foto: Gilson Soares, 2014.

Depois do rápido interregno – rapaz, que isso?! – provocado pela minha apresentação ao grupo – feita pelo Guilherme com as lisonjas que a amizade autoriza – Henrique Cazes continuou a contar as muitas histórias saborosas dos bastidores da música e do show bizz brasileiros, com a segurança de quem esteve presente a boa parte do que relatava.

De lambuja, Cazes cantava algumas das indecorosas paródias que ele costuma criar para clássicos do cancioneiro brasileiro, com opção preferencial pelo samba, uma de suas praias musicais preferidas.

Sobre Henrique Cazes, bastaria dizer que ele participou de algumas iniciativas fonográficas muito importantes para a história e para o engrandecimento instrumental da nossa música.[ 1 ]

Mas isso não estava sendo considerado ali na divertida roda vespertina, no centro daquele outeiro urbanizado, que atende pelo topônimo de Montanha.

O Cazes que exercitava a sua regência parlamentar sobre aquele conjunto de ouvintes, era mais o escritor que o instrumentista ou o pesquisador ou o produtor musical.

Escritor, eu disse?

Sim, entre outras coisas publicadas, este músico lançou em 2002, pela José Olympio Editora, um livro muito divertido: Suíte Gargalhadas.

O subtítulo do livro explica tudo: Cento e tantas histórias engraçadas sobre música e músicos.

O livro é isso.

E era esse – o Cazes de Suíte Gargalhadas – que presidia aquele parlamento instalado à margem da principal praça da cidade mais extrema do noroeste capixaba, no declínio da tarde do sábado, 7 de junho de 2014.

A contribuição do acaso para que eu estivesse – como estive logo depois – presente ao último show da temporada capixaba de Sérgio Samba Sampaio, foi, sabe o atento leitor, pequena ou nenhuma.

Agora, a minha presença ali, no meio daquele bando hilariante de feras musicais, sob a regência parlamentar de Henrique Cazes, ouvindo histórias cujos personagens são nomes importantes da música brasileira e, ainda, recheadas das paródias impagáveis criadas pelo músico, isso, não tenho dúvida, eu devo ao acaso (com a contribuição providencial do Quinto Moxuara, com o seu chapéu de aba curta e o seu sorriso amistoso).

De mim só foi exigido que chegasse a Montanha no dia planejado; que escolhesse para hospedagem aquele hotelzinho a coisa de cinquenta passos dali; que, ao invés de um cochilo para me recuperar da noite mal dormida na Capital, resolvesse andar à toa, deixando Dom Quixote, Sancho Pança e a pretinha repousando; e que, afinal, ao sair, atravessasse de menesguei – de outro jeito, não teria dado certo – aquela avenida que tangencia a praça principal da pequena cidade desatenta.

Foi só o que fiz.

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NOTAS

[ 1 ] Com o seu cavaquinho foi, por exemplo, um dos integrantes do conjunto Coisas Nossas que, por iniciativa de João Máximo e Carlos Didier, insuperáveis biógrafos do Poeta da Vila, pesquisou com muita seriedade e dedicação – e registrou em discos – uma parte da obra de Noel Rosa que nunca tinha sido publicada antes. Daí resultou duas preciosidades fonográficas que fazem parte do acervo do Clube Capixaba do Vinil. Uma delas é o álbum Noel Rosa, Inédito e Desconhecido, lançado em 1983 – quase 50 anos depois da morte do compositor – trazendo 14 sambas, muitos deles nunca gravados e alguns totalmente esquecidos. A outra é o elepê com a gravação da opereta A Noiva do Condutor, criada por Noel em parceria com o regente húngaro Arnold Gluckmann. Além disso, Henrique Cazes foi o idealizador de um dos registros mais importantes da história fonográfica brasileira: o elepê Orquestra Brasília – O maior legado escrito de Pixinguinha. Raridade que também compõe o acervo do Clube.

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Gilson Soares é poeta e nasceu em Ecoporanga, no extremo noroeste do Estado do Espírito Santo, em 10 de fevereiro de 1955. (Para obter mais informações sobre o autor e outros textos de sua autoria publicados neste site, clique aqui)

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